Criação dos Deuses I: Reino das Tempestades

Fengshen: Uma Tempestade de Espetáculo e Promessa

Duas coisas me chamam atenção em Criação dos Deuses I: Reino das Tempestades, lançado em 2023: a audácia e a promessa. Audácia em se propor a adaptar um clássico da literatura chinesa tão complexo e amado como o Fengshen Yanyi para as telas, prometendo uma trilogia épica. Promessa em seus momentos de pura beleza visual e ação visceral, momentos que vislumbram o potencial colossal dessa empreitada. Se o filme cumpre totalmente essa promessa? Não totalmente, mas a jornada já valeu a pena.

A sinopse é simples, sem spoilers: uma guerra colossal entre humanos, imortais e monstros, baseada na mitologia chinesa, recriando conflitos que, segundo a narrativa, ocorreram há mais de três mil anos. É um cenário grandioso, povoado por deuses, demônios, e uma miríade de criaturas fantásticas, ideal para um épico de fantasia oriental. E, meu Deus, o filme não economiza em escala!

A direção de Urusu-Shan é impressionante. A construção de mundos é impecável, a fotografia é exuberante, vibrante e rica em detalhes, transmitindo a opulência e a selvageria da China antiga com maestria. A coreografia das lutas é frenética e bem orquestrada, misturando artes marciais com efeitos especiais de alta qualidade, sem cair no excesso que muitas vezes torna esses filmes indigeríveis. Há momentos de pura poesia visual, cenas que transcendem a mera ação e alcançam um nível quase pictórico.

No entanto, o roteiro, coescrito por Urusu-Shan, Ran Jianan, Cao Sheng e Ran Ping, é onde o filme patina um pouco. A quantidade de personagens e a complexidade da trama, inerentes à obra original, criam um ritmo inicial um pouco lento e, para o público desavisado, um tanto confuso. Embora a introdução de cada personagem seja importante para a compreensão da trama em longo prazo, para uma audiência não familiarizada com o Fengshen Yanyi, este ponto inicial poderia ser mais conciso, gerando um ritmo mais eficiente na primeira parte do filme. Entretanto, não se pode negar o esforço de se manter fiel à mitologia, o que por si só já é uma proeza a ser elogiada.

As atuações são um ponto alto. Kris Phillips se destaca como o Rei Zhou, transmitindo a decadência e a perversidade do personagem com convincente poder. A presença de veteranos como Li Xuejian e Huang Bo traz peso e experiência para o elenco, equilibrando a energia frenética da narrativa. Os atores mais jovens também se saem bem, principalmente Yu Shi como Ji Fa, mostrando um carisma promissor.

Os pontos fortes são inegáveis: a grandiosidade da produção, a beleza visual, a riqueza dos detalhes, a ação bem coreografada, e o elenco talentoso. Os pontos fracos, acredito, residem na dificuldade em criar uma narrativa enxuta e eficiente para uma audiência que não conhece a obra original, e em alguns momentos que parecem apressados na introdução da trama mais ampla.

Criação dos Deuses I: Reino das Tempestades não é apenas uma adaptação, mas uma declaração de intenção. Um filme que demonstra um desejo de levar a rica mitologia chinesa para um público global, através de um espetáculo visual e narrativo ambicioso. A mensagem de luta contra a tirania e a busca pela justiça, embora sutil em alguns momentos, está presente e é um tema universalmente relevante. Sim, o filme poderia ter sido mais conciso, mas sua audácia e sua capacidade de criar momentos verdadeiramente memoráveis são razões suficientes para recomendá-lo. A expectativa pela segunda e terceira partes da trilogia é enorme e, avaliando o que foi apresentado, a promessa de uma obra-prima é real. Para fãs de fantasia épica e para aqueles que apreciam a beleza do cinema oriental, este filme é uma experiência imperdível. Espero ansiosamente por 2026 (ou ainda mais tarde) e a continuação da jornada para testemunhar o desenvolvimento dessa promissora e épica aventura.