Black Dog

Black Dog: Um Retorno À Natureza Humana, Com Garras e Rabo

Em um ano em que o cinema parece cada vez mais dividido entre espetáculos vazios e dramas excessivamente estilizados, chega Black Dog, um filme que, apesar de suas fragilidades, me tocou de uma forma inesperada. Dirigido por Guan Hu e estrelado por um elenco que inclui Eddie Peng,佟丽娅, e o sempre intrigante Jia Zhangke, o longa-metragem de 2024 nos apresenta a Lang Yonghui (Peng), um homem que retorna à sua cidade natal após um período na prisão, trazendo consigo um passado nebuloso e uma relação complexa com seu pai, um cuidador de zoológico. A trama se desenrola gradualmente, revelando as circunstâncias que levaram à sua prisão e desvendando os laços familiares fragmentados que o conectam a sua terra natal. A sinopse, embora sucinta, deixa claro que esta não é uma simples história de redenção; há camadas de complexidade humana a serem descascadas.

A direção de Guan Hu é segura, embora às vezes se perca em um ritmo um tanto irregular. Há momentos de beleza contemplativa, em que a câmera se deleita nos detalhes da paisagem e na relação quase silenciosa entre Lang e o seu cachorro, um personagem silencioso, mas vital para a trama. Entretanto, a transição entre esses momentos de lirismo e as cenas mais densas, mais voltadas para o drama familiar, nem sempre é suave. O roteiro, escrito por Ge Rui, Guan Hu e Wu Bing, acerta ao construir uma atmosfera carregada de mistério e emoção contida, mas poderia ser mais assertivo em certos momentos. A falta de clareza em alguns pontos da narrativa me deixou com a sensação de que algumas informações importantes poderiam ter sido melhor exploradas.

Apesar disso, as atuações salvam a pele do filme. Eddie Peng entrega uma performance contida e poderosa, mostrando a complexidade interna de Lang com sutileza. A química entre ele e佟丽娅, que interpreta Putao, é palpável, adicionando um elemento romântico que funciona como um contraponto à aspereza do drama principal. A presença de Jia Zhangke, no papel de Uncle Yao, acrescenta um peso extra à narrativa, conferindo-lhe uma aura de realismo sombrio. A atuação é discreta, mas potente.

A força de Black Dog reside na sua capacidade de explorar, sem sentimentalismos baratos, a complexidade das relações humanas. O vínculo entre Lang e seu cão, sugerido nos trechos de crítica que li, é um ponto alto do filme, um elo simbólico que representa a lealdade e a busca por conexão em um mundo hostil. A relação com o pai, por sua vez, retrata com precisão a dificuldade de comunicação e a carga de expectativas não ditas que podem corroer os laços familiares. O filme não oferece respostas fáceis; ele apresenta perguntas e as deixa pairando no ar, instigando a reflexão do espectador.

Porém, não podemos ignorar seus pontos fracos. O ritmo, como já mencionei, é um deles. Há momentos em que a narrativa se arrasta, perdendo o foco. A ambivalência do roteiro, enquanto cativante em alguns momentos, também resulta em alguma confusão sobre a real motivação de algumas personagens. O final, embora não totalmente insatisfatório, deixa margem para interpretações diversas e não chega a oferecer o fechamento que se esperaria de um drama dessa natureza.

No geral, Black Dog é um filme que vale a pena ser visto, apesar de suas falhas. Recomendá-lo depende do tipo de espectador. Aqueles que apreciam dramas contemplativos, com foco em personagens complexos e uma atmosfera carregada de ambiguidade, encontrarão muito a admirar em Black Dog. Para aqueles que buscam uma narrativa mais direta e com um desfecho mais conclusivo, ele pode ser um tanto frustrante. Mas, se você está disposto a mergulhar em uma história que aborda temas tão profundos como o perdão, a família e a redenção, sem soluções mágicas, você pode se surpreender com a força e a sensibilidade desta obra. A experiência de assisti-lo é como encontrar um cachorro ferido, silencioso, que revela lentamente sua alma, sua história de sofrimento e esperança. Uma história que, mesmo com suas imperfeições, permanece marcante.