Em um mundo onde a atenção se dissolve tão facilmente quanto um cubo de açúcar em café quente, algumas histórias conseguem fincar raízes tão profundas na nossa memória que, anos depois, ainda reverberam. Orphan Black é uma dessas. E se você me perguntar por que, em pleno setembro de 2025, eu ainda sinto a necessidade de revisitar essa série, a resposta é simples: ela não apenas quebrou barreiras de gênero e atuação, ela as reconstruiu do zero, nos forçando a questionar tudo o que pensávamos saber sobre identidade, família e o que nos torna, verdadeiramente, humanos.
Quando Orphan Black surgiu, lá em 2013, o conceito de clones não era novidade para a ficção científica. Mas a premissa da nossa heroína improvável, Sarah Manning, tropeçando num mistério ao assumir a identidade de uma mulher idêntica a ela que acabou de cometer suicídio, já dava a entender que a jornada seria turbulenta. O que veio depois, porém, foi algo muito além da troca de identidades: um mergulho vertiginoso num complô genético onde Sarah se vê cercada por mais mulheres que compartilham seu rosto, todas elas sujeitas de um experimento. De repente, a luta para pagar as contas se transforma em uma corrida desesperada para salvar a própria pele e desvendar quem são os “criadores” por trás dessa teia. É um coquetel explosivo de drama e ficção científica, com pitadas de fantasia que te puxam para um universo deliciosamente complexo.
O coração pulsante de Orphan Black, o que realmente eleva a série de uma boa ideia a um fenômeno cultural, é um nome: Tatiana Maslany. Sabe, a gente fala muito sobre “atuações de prestígio”, mas o que Maslany entregou aqui foi uma verdadeira aula, um workshop ambulante de como encarnar múltiplos personagens com tal maestria que você esquece que é a mesma atriz. Não estou falando apenas de sotaques ou perucas, estou falando da alma de cada uma. Você vê o sarcasmo protetor e a lealdade feroz de Sarah; a inteligência e a paixão científica de Cosima, sempre com aquele toque de vulnerabilidade; a neurose suburbana e o amor incondicional de Alison; o olhar gélido e a ambição calculista de Rachel; e a fúria primal e a fé inabalável de Helena. Cada clone tem uma “impressão digital” emocional tão única que, muitas vezes, eu me pegava esquecendo que o rosto era o mesmo. É como observar um escultor trabalhando com a mesma argila para criar cinco obras de arte completamente diferentes, cada uma com sua própria história gravada em cada curva. É simplesmente… fascinante.
Mas não se engane, Orphan Black não é um show de uma mulher só. O universo dos clones Leda (e, posteriormente, Castor) só ganha a sua rica tapeçaria graças ao elenco de apoio que serve como a âncora para a sanidade (ou a loucura) delas. Jordan Gavaris, como Felix “Fee” Dawkins, o irmão adotivo de Sarah, é o porto seguro, o confidente sarcástico e a bússola moral de um clã desorientado. A química entre ele e Maslany é palpável, um dos relacionamentos mais autênticos e comoventes que já vi na TV. E o que dizer de Siobhan “Mrs. S” Sadler, interpretada por Maria Doyle Kennedy? Ela é a figura materna enigmática, protetora e perigosa, cujo amor é tão profundo quanto seus segredos. E, claro, Josh Vokey como Scott Smith, o biólogo parceiro de Cosima, que nos lembra que nem todo gênio está a salvo das peculiaridades do Clube de Clones. Mais tarde, Ari Millen entra na jogada, apresentando os clones masculinos Castor, e a habilidade dele em dar nuances a cada um, assim como Maslany faz, é notável, desafiando a nossa percepção de gênero e criação.
Atributo | Detalhe |
---|---|
Criadores | Graeme Manson, John Fawcett |
Produtoras | Tatiana Maslany, Claire Welland |
Elenco Principal | Tatiana Maslany, Jordan Gavaris, Josh Vokey, Maria Doyle Kennedy, Ari Millen |
Gênero | Drama, Ficção Científica e Fantasia |
Ano de Lançamento | 2013 |
Produtoras | Bell Media, Temple Street Productions, BBC America |
A série, criada por Graeme Manson e John Fawcett, é um tour de force que não tem medo de fazer perguntas incômodas. O que nos define? Nossos genes? Nossa família? As escolhas que fazemos? Orphan Black explora a fundo a complexidade da identidade e da autonomia corporal, especialmente em um contexto feminino, onde as mulheres são literalmente objetos de um experimento sem seu consentimento. Mas, ironicamente, são elas que se levantam para reivindicar sua própria agência. É uma história de irmandade, não só de sangue, mas de espírito, onde os laços que você escolhe podem ser mais fortes do que qualquer coisa ditada pelo DNA.
A produção, com o apoio de Bell Media, Temple Street Productions e BBC America, conseguiu entregar um nível de qualidade visual e narrativa que muitas produções com orçamentos maiores sequer sonham. A habilidade em criar cenas onde Maslany interage consigo mesma, de forma tão fluida e crível, é um testemunho da inventividade por trás das câmeras, com Claire Welland e a própria Tatiana Maslany atuando também como produtoras. O ritmo é implacável, com reviravoltas que te pegam de surpresa a cada esquina, mas nunca sacrificando o desenvolvimento dos personagens em nome da trama.
Então, sim, aqui estamos nós, em 2025, e Orphan Black continua sendo uma daquelas joias raras que, uma vez descobertas, se recusam a ser esquecidas. Ela nos lembra que a ficção científica não precisa ser apenas sobre naves espaciais e lasers; ela pode ser sobre a busca por quem somos, a força da família (biológica ou não) e a luta inabalável por um lugar no mundo. Se você ainda não embarcou nessa montanha-russa emocional, eu só tenho uma coisa a te dizer: se prepare. Você está prestes a conhecer algumas das mulheres mais complexas, divertidas, aterrorizantes e, acima de tudo, humanas que a televisão já nos deu o prazer de testemunhar. E elas, garanto, vão ficar com você por muito tempo.