Ah, a família. Sempre ela, né? Aquele nó cego que a gente tenta desatar a vida inteira, ou que nos amarra com uma força que nem sabíamos que existia. Por que será que, mesmo com tanto material disponível sobre o tema, um filme como Anemone consegue se infiltrar na nossa pele de um jeito tão visceral? Talvez seja porque, no fundo, todos nós carregamos as cicatrizes e os confortos de laços que nos moldaram, quer queiramos ou não. Foi exatamente essa curiosidade, essa busca por um espelho das nossas próprias complexidades, que me puxou para a tela da Focus Features, nos dias que antecedem o lançamento oficial deste drama que promete sacudir as estruturas do cinema em 2025.
Anemone, para mim, não é apenas um título. É uma metáfora viva. Pense na anêmona marinha: bonita, vibrante, com seus tentáculos que podem ser acolhedores ou perigosamente urticantes. Ela se fixa, busca a luz, vive em simbiose, mas também tem seus mecanismos de defesa. Não é uma imagem perfeita para a família Stoker, especialmente para Ray e Jem, os irmãos interpretados por Daniel Day-Lewis e Sean Bean? É uma família que, sob a superfície de uma aparente calmaria, esconde correntes profundas e turbulências latentes.
O que o diretor Ronan Day-Lewis, em uma parceria de roteiro que, olha só, ele dividiu com o pai, Daniel Day-Lewis, nos oferece aqui não é uma jornada simples de mocinhos e vilões. Longe disso. É um mergulho sem fôlego nas águas turvas das relações familiares, onde cada personagem é um universo em si, com suas próprias marés internas. Daniel Day-Lewis, como Ray Stoker, é um espetáculo à parte. Aquele olhar que ele tem, carregado de anos de silêncio e decisões não ditas, é de partir o coração e, ao mesmo tempo, nos faz querer desvendar cada ruga de sua expressão. Você vê as mãos de Ray, às vezes apertando um copo com uma força desproporcional, às vezes pairando no ar, hesitantes, e entende a avalanche de sentimentos que ele tenta conter. Não precisa de palavras para saber o que se passa lá dentro.
E Sean Bean, como Jem Stoker, é o contraponto ideal. A performance de Bean é como uma onda quebra na praia: começa suave, mas termina com uma força avassaladora. Ele encarna a frustração e o amor fraterno com uma autenticidade que dói. A dinâmica entre os dois irmãos, Ray e Jem, é o coração pulsante do filme. Há uma história não contada entre eles, um peso compartilhado que se manifesta em pequenos gestos, em olhares de canto, em frases interrompidas. É a velha questão do pai e filho, claro, mas também do irmão e irmão, uma simbiose complexa onde o amor e o ressentimento coexistem como duas faces da mesma moeda. Será que você já se viu numa situação em que a pessoa que você mais ama é também aquela que mais te irrita, que te provoca até o limite? Anemone explora isso com uma maestria rara.
Atributo | Detalhe |
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Diretor | Ronan Day-Lewis |
Roteiristas | Daniel Day-Lewis, Ronan Day-Lewis |
Produtores | Jeremy Kleiner, Dede Gardner |
Elenco Principal | Daniel Day-Lewis, Sean Bean, Samuel Bottomley, Safia Oakley-Green, Samantha Morton, Sid Akbar Ali, Paul Butterworth |
Gênero | Drama |
Ano de Lançamento | 2025 |
Produtoras | Focus Features, Plan B Entertainment, Absinthe Film Entertainment |
A presença dos mais jovens, Samuel Bottomley como Brian e Safia Oakley-Green como Hattie, injeta uma nova camada de vulnerabilidade e esperança (ou a falta dela) na narrativa. Eles são como as anêmonas mais jovens, ainda se adaptando ao leito marinho, tentando encontrar seu lugar e entender as correntes que agitam seus parentes mais velhos. Brian, em particular, é um personagem que nos força a confrontar as consequências dos ciclos familiares, a herança invisível que se passa de uma geração para a outra. E não posso deixar de mencionar a sempre potente Samantha Morton, cuja Nessa é uma rocha em meio ao turbilhão, uma mulher que vê e sente mais do que ousa dizer. A maneira como ela segura o olhar de Ray, ou oferece um consolo silencioso a Jem, mostra a profundidade de sua performance.
A direção de Ronan Day-Lewis é íntima, quase sufocante no bom sentido. A câmera muitas vezes parece respirar junto com os personagens, capturando cada nuance, cada tremor. Não há pressa, há uma deliberada imersão no tempo e no espaço, que permite que as tensões se construam organicamente. E o roteiro, escrito a quatro mãos pelos Day-Lewis, não busca respostas fáceis. Ele prefere levantar perguntas, deixar espaços para a reflexão, para que o público se torne parte ativa da desconstrução daquela família. Não é sobre o que eles dizem, mas sobre o que eles não conseguem dizer. É a complexidade das dinâmicas familiares, sabe? Aquele tipo de coisa que a gente vive todo dia, mas raramente vê retratado com tanta honestidade na tela.
Anemone é um filme que não tem medo de ser desconfortável, de cutucar feridas que talvez não estejam totalmente cicatrizadas em nós mesmos. É um daqueles dramas que ficam com você muito tempo depois que as luzes se acendem, ecoando em sua mente como uma melodia melancólica. É uma prova de que, para tocar fundo, não é preciso grandiosidade épica, mas sim a coragem de olhar para dentro, para as micro-explosões e implosões que acontecem no palco mais íntimo de todos: o da família humana. Se você, como eu, busca filmes que te façam pensar, sentir e, quem sabe, até reconsiderar alguns nós da sua própria árvore genealógica, prepare-se. Este aqui, definitivamente, vale a pena o mergulho.