Cheguei a pensar, por um instante fugaz, que A Cadeira seria uma daquelas propostas artísticas de vanguarda que transformam um objeto inanimado em protagonista. Você sabe, uma alegoria existencial sobre o peso das escolhas, ou algo do tipo. Mas, caramba, como eu estava enganado – e ainda bem que estava! O que Tim Robinson e Zach Kanin nos entregaram em 2025, com a direção de Farhan Rana Rajpoot, é uma verdadeira joia da comédia, um mergulho tão preciso no absurdo cotidiano que nos faz questionar se a vida já não é, em si, a maior das conspirações.
A gente, vez ou outra, se pega num embaraço no trabalho, não é? Aquela gafe que nos faz suar frio, desejar um buraco negro para nos engolir, ou simplesmente fantasiar com a demissão e a vida nômade. William Ronald Trosper, interpretado por um Tim Robinson em sua melhor forma – e isso não é pouca coisa para quem já riu até a dor de cabeça com suas outras criações –, vive isso. Mas não é um embaraço qualquer. É daqueles que reverberam, que te perseguem pela cafeteria da empresa, que fazem o suor escorrer pela espinha mesmo quando você já está em casa, fingindo normalidade para a família. E é exatamente desse pequeno (mas colossal, para William) constrangimento que o fio da meada de uma grande conspiração começa a se desenrolar.
Veja bem, a genialidade aqui está no contraste. William é o epítome do homem comum, o pai de família que tenta equilibrar as contas, as expectativas dos filhos e a rotina burocrática. Ele tem aquela energia de quem está sempre à beira de um colapso nervoso, mas tenta manter a fachada de “tudo sob controle”. E é por isso que vê-lo tropeçar de cabeça em algo tão monumental quanto uma conspiração global (ou seria local? A ambiguidade é um tempero delicioso aqui) é tão hilário e, de certa forma, identificável. Quem nunca sentiu que a própria vida estava conspirando contra si depois de um dia particularmente ruim? Tim Robinson não apenas atua William, ele se torna William, com aqueles olhares perdidos, as reações exageradas de pânico contido e a capacidade ímpar de transformar a menor inconveniência em uma catástrofe pessoal. Suas mãos tremem ao segurar um café, sua voz falha ao tentar explicar o inexplicável. É o “mostrar, não contar” elevado à enésima potência.
O elenco, ah, o elenco! Lake Bell como Barb Trosper é a âncora de sanidade (ou, pelo menos, de uma sanidade mais funcional) que William desesperadamente precisa, mas que ele, na sua espiral de paranoia cômica, raramente consegue ouvir. A dinâmica entre os dois é pura comédia conjugal, com Barb navegando entre a preocupação genuína e o desespero de ver seu marido cada vez mais pirado. E os filhos? Sophia Lillis como Natalie e Will Price como Seth são o espelho da geração Z, assistindo ao caos paternal com uma mistura de tédio, vergonha alheia e uma ponta de diversão irônica. Joseph Tudisco, no papel de Mike Santini, adiciona uma camada extra de imprevisibilidade, sendo aquele tipo de colega que pode ser tanto um aliado crucial quanto o catalisador do próximo desastre. A química entre eles é palpável, transformando a família Trosper em um organismo disfuncional que, de alguma forma, funciona.
Atributo | Detalhe |
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Criadores | Tim Robinson, Zach Kanin |
Diretor | Farhan Rana Rajpoot |
Elenco Principal | Tim Robinson, Lake Bell, Sophia Lillis, Will Price, Joseph Tudisco |
Gênero | Comédia |
Ano de Lançamento | 2025 |
Produtoras | Hyperobject Industries, Zanin Corp, HBO |
A comédia de A Cadeira não é daquelas que te dá risadas fáceis e unidimensionais. Ela é ácida, observacional e permeada por um humor de constrangimento que nos faz rir e, ao mesmo tempo, sentir uma pontada de pena. É a comédia que emerge da dissonância entre a intenção de William de ser um adulto funcional e a realidade de ser um peão desajeitado num jogo que ele mal compreende. Os criadores, Tim Robinson e Zach Kanin, têm um domínio invejável dessa linguagem, e Farhan Rana Rajpoot os traduz visualmente com um ritmo impecável. As transições de cena, a maneira como a câmera foca nos detalhes mais patéticos ou nos olhares mais desesperados, tudo contribui para a experiência imersiva de estar na pele (suada) de William.
Ver A Cadeira é uma experiência curiosa. É como estar numa montanha-russa que você sabe que vai te fazer gritar, mas cujos trilhos são feitos de situações tão mundanas que o contraste se torna o próprio motor da diversão. A produção da Hyperobject Industries, Zanin Corp e HBO garante que, por trás do caos hilário, há um polimento técnico que eleva a narrativa. Não é só uma série sobre um cara que se mete em encrenca; é uma sátira perspicaz sobre a fragilidade da nossa percepção de controle, sobre como um pequeno deslize pode nos jogar em um buraco de coelho onde a lógica se dobra e a paranoia vira profecia. E no final das contas, não é isso que a boa comédia faz? Nos faz rir do que nos apavora, nos faz ver o absurdo onde só víamos monotonia?
Então, se você busca uma série que desafie suas expectativas sobre o que uma comédia pode ser, que te faça rir alto enquanto se identifica secretamente com o desespero existencial de um homem comum, A Cadeira é o seu programa. Ela não é apenas uma série; é um espelho distorcido da nossa própria existência, um lembrete engraçado de que, às vezes, tudo o que precisamos é de uma boa risada para encarar o próximo constrangimento – ou a próxima grande conspiração – que a vida nos reserva. E quem sabe, talvez a cadeira, afinal, não seja apenas um móvel, mas o trono do nosso próprio e hilário desespero.