O Torturador (1980): Uma Viagem Incômoda no Tempo, 45 Anos Depois
Quase meio século depois de sua estreia em 19/05/1980, reencontrei O Torturador, um filme de Antônio Calmon que, em 18/09/2025, ainda provoca discussões e me faz questionar sua relevância – e sua coragem – no contexto atual. Não se engane: esta não é uma obra fácil de digerir. A sinopse nos apresenta um thriller de ação e crime, que acompanha Capitão Jonas (Jece Valadão) em uma trama sombria e violenta. A trama envolve prostituição masculina e aborda a comunidade LGBTQIA+ de forma que, para os padrões de 2025, parece, no mínimo, problemática. Mas antes de qualquer julgamento apressado, vamos destrinchar essa relíquia cinematográfica.
Direção, Roteiro e Atuações: Um Espelho da Época
Antônio Calmon, na direção, imprime um estilo que reflete a estética dos anos 80, com uma fotografia e ritmo próprios daquela década. A câmera se move com uma certa lentidão, às vezes quase contemplativa, contrastando com a violência intrínseca da narrativa. O roteiro, assinado por Calmon, Alberto Magno e o próprio Jece Valadão, carrega a marca de seu tempo, sem disfarçar o olhar moralizante e, em alguns momentos, francamente preconceituoso, sobre a temática da prostituição masculina e a comunidade LGBTQIA+.
As atuações, por sua vez, são um capítulo à parte. Jece Valadão, também produtor do filme, entrega uma performance visceral como o Capitão Jonas, porém, sem a sutileza e complexidade que esperamos em personagens semelhantes nos dias de hoje. Otávio Augusto e Vera Gimenez contribuem com seus desempenhos típicos da época, confirmando o tom geral da produção. A presença de Ary Fontoura, em um papel de apoio, é uma curiosa, e talvez, inesperada adição ao elenco. A jovem Thaís Portinho, como Leonor, oferece um contraponto, apesar de sua personagem ser construída com estereótipos arraigados.
| Atributo | Detalhe |
|---|---|
| Diretor | Antônio Calmon |
| Roteiristas | Antônio Calmon, Alberto Magno, Jece Valadão |
| Produtor | Jece Valadão |
| Elenco Principal | Jece Valadão, Otávio Augusto, Vera Gimenez, Thaís Portinho, Ary Fontoura |
| Gênero | Ação, Crime |
| Ano de Lançamento | 1980 |
Forças e Fraquezas: Um Legado Contraditório
O Torturador possui o mérito de abordar temas ousados para sua época, ainda que de forma polêmica e, em muitos aspectos, problemática para os dias atuais. A coragem de enfrentar a realidade obscura da prostituição masculina, principalmente dentro da comunidade LGBTQIA+, merece ser reconhecida. Entretanto, a forma como o faz, através de lentes preconceituosas e moralistas, torna a experiência de assistir ao filme desconfortável e, em certos momentos, insuportável.
O filme sofre, irremediavelmente, da falta de sensibilidade em relação aos personagens LGBTQIA+. Os personagens não são indivíduos complexos, mas sim arquétipos que reforçam preconceitos. É nesse aspecto que o filme falha mais estrondosamente. A ausência de uma representação autêntica e respeitosa da comunidade LGBTQIA+ compromete a obra e a torna um produto de seu tempo, cuja validade precisa ser questionada a luz da consciência moderna.
Temas e Mensagens: Uma Interpretação Necessária
A principal mensagem de O Torturador, infelizmente, não é de inclusão ou empatia. Pelo contrário, o filme parece querer usar a criminalidade e a vulnerabilidade dos personagens para corroborar certos julgamentos morais da época. A obra reflete, de maneira bastante crua, os preconceitos e a moralidade sexualmente repressora do início dos anos 80 no Brasil. Analisá-lo em 2025 significa entender o contexto histórico e, simultaneamente, reconhecer sua inegável falta de sensibilidade.
Conclusão: Um Filme Para Ser Visto com Cautela
O Torturador não é um filme fácil. Sua violência, o olhar moralizante sobre os personagens LGBTQIA+ e a estética datada o tornam uma experiência desconcertante. No entanto, sua própria problematicidade o torna um documento histórico importante, uma janela para a compreensão de como se retratava certos temas há quase meio século. Recomendo sua visualização, mas com a ressalva de que se trata de uma obra que deve ser analisada criticamente, sempre considerando o contexto da época em que foi produzido e tendo em mente os avanços, mesmo que insuficientes, da nossa compreensão sobre questões de gênero e sexualidade. Não é uma recomendação leve. É um convite para um mergulho desconfortável na história do cinema nacional. A disponibilidade em plataformas digitais deve ser pesquisada, afinal, o filme não encontra-se facilmente em streaming em 2025.




