O Prisioneiro

A chuva lá fora, em 2023, quando O Prisioneiro estreou, martelava os vidros como uma consciência inquieta, e me pergunto se Fernando Costa não arquitetou cada pingo para ressoar com o que veríamos na tela. Eu, um simples espectador que se aventura pelas salas escuras em busca de histórias que me provoquem, raramente me deparo com algo que insiste em morar na minha cabeça por tanto tempo. Mas O Prisioneiro é desses filmes que, mesmo dois anos depois do seu lançamento no Brasil, ainda me cutuca. Não é só um thriller; é um espelho.

Imagine-se preso. Não em uma cela de verdade, mas em um saguão de hotel na beira do nada, com a tempestade engolindo qualquer chance de fuga. O mundo lá fora é só barulho e relâmpago, e o mundo dentro desse hotel, ah, esse é um caldeirão borbulhante. A notícia corre como fogo em palha seca: um criminoso foi pego. E, de repente, cada rosto que você encontra, cada olhar que cruza o seu, parece esconder uma intenção. Quem ali está pela justiça e quem está sedento por algo mais primal, mais visceral? Essa é a atmosfera que Fernando Costa, em sua dupla função de diretor e roteirista, nos lança, e faz isso com uma maestade sufocante.

No centro desse turbilhão está Santana, interpretado com uma vulnerabilidade quase palpável por Ed Canedo. Santana não é um herói de ação, nem um detetive intrépido. Ele é um homem comum, um de nós, que carrega nas costas o peso de uma mentira antiga. Sua vida, que talvez fosse pacata antes, se estilhaça quando o passado, como uma sombra insistente, o alcança. Foi o testemunho dele, um testemunho falso, que colocou o tal criminoso atrás das grades. E agora, com o tal prisioneiro em algum lugar do hotel ou nas proximidades, a culpa de Santana se manifesta não como um sussurro, mas como um grito estridente. Canedo não precisa de monólogos longos; o nervosismo em suas mãos, a forma como ele desvia o olhar, a tensão que se acumula em seus ombros – tudo isso nos mostra a tormenta interior, nos fazendo sentir cada gota do seu arrependimento.

E não pense que Santana está sozinho em sua angústia moral. O elenco todo serve a essa tapeçaria de dilemas humanos. Juliana Tosin, como Ana Carrasco, não é apenas um rosto no meio da multidão; ela é uma força que navega pelas águas turvas desse mistério. Seus olhos, a forma como ela pondera cada palavra, nos faz questionar suas próprias motivações, sua própria relação com a verdade e a vingança. Não há mocinhos e bandidos claros aqui, e essa é uma das grandes virtudes do filme. David Formiga, com seu Valdemar, e Paulo Matos, como Manuel Bandeirante, encarnam nuances da comunidade, da sede de justiça popular que pode rapidamente desandar para o linchamento moral. E Hélio Barbosa, no papel do Delegado Messias Moreno, é a representação da lei, mas uma lei que parece flutuar, incerta, no meio do caos e das emoções à flor da pele. Ele é a bússola que tenta apontar para o norte, mas o campo magnético está totalmente distorcido.

Atributo Detalhe
Diretor Fernando Costa
Roteirista Fernando Costa
Produtores Fernando Costa, Christofer Pallu
Elenco Principal Ed Canedo, Juliana Tosin, David Formiga, Paulo Matos, Hélio Barbosa
Gênero Thriller, Mistério
Ano de Lançamento 2023
Produtora Filmes do Asilo Febril

O que me prendeu em O Prisioneiro não foi apenas a intriga de quem é quem, mas a reflexão sobre o que fazemos em nome da verdade, ou do que acreditamos ser a verdade. A busca de Santana por expiação é uma jornada tortuosa, e o filme não se esquiva de nos mostrar o quão sujo o caminho para a redenção pode ser. É um lembrete vívido de que nem todas as prisões são feitas de concreto e grades; algumas são construídas com mentiras e arrependimento, e delas é muito mais difícil escapar.

A “Filmes do Asilo Febril” – o nome da produtora já diz muito, não é? – com Fernando Costa e Christofer Pallu na produção, parece ter encontrado o terreno perfeito para essa narrativa febril, quase delirante. A estética do filme, com seus ambientes escuros, a iluminação que joga com sombras e a trilha sonora sutilmente perturbadora, eleva a tensão a um patamar quase insuportável. Você sente o peso da chuva, o cheiro de mofo do hotel antigo, a claustrofobia do espaço limitado. É uma experiência sensorial que te puxa para dentro da tela, quer você queira ou não.

O Prisioneiro não é um filme que te entrega respostas fáceis. Pelo contrário, ele te lança perguntas que ecoam muito tempo depois dos créditos finais subirem. O que é justiça, afinal? E o que estamos dispostos a sacrificar por ela? E qual é o preço da verdade quando ela está maculada pela mentira? Esse filme, lançado silenciosamente em 2023, é um daqueles achados que merecem mais do que uma sessão casual. Ele merece ser dissecado, debatido, sentido. É um convite a olhar para dentro, para nossas próprias zonas cinzentas, para os prisioneiros que todos nós, de alguma forma, carregamos dentro de nós. E isso, para mim, é o verdadeiro poder do cinema.

Oferta Exclusiva 58FF

Tente a sua sorte com uma oferta especial!

Descubra jogos e promoções exclusivas. Jogue com responsabilidade.

Ver Oferta