Olha, eu não sei você, mas eu sou daquelas pessoas que, quando a vida resolve dar um nó cego, a primeira coisa que me vem à cabeça é: “Que karma é esse que eu tô pagando?”. É um alívio temporário, né? Jogar a culpa em algo maior, abstrato, que a gente mal entende. Por isso, quando esbarrei com o título Que Culpa Tem o Carma? lá em 2022, logo na época do lançamento no Brasil, em 3 de agosto, meu radar apitou. Um filme que prometia explorar justamente essa nossa tendência de atribuir ao destino as nossas próprias desgraças (ou nem tão desgraças assim). Dois anos se passaram e, confesso, o questionamento continua rondando a minha cabeça.
A diretora Elisa Miller, junto dos roteiristas Marcelo Tobar e Fernanda Eguiarte, nos convida a mergulhar no mundo de Sara (interpretada com uma dose deliciosa de auto-depreciação por Aislinn Derbez). E que mundo! É um universo onde a vida dela parece ser uma sequência ininterrupta de pequenos (e às vezes nem tão pequenos) desastres. Tudo dá errado, e para ela, a culpa é sempre daquele suposto azar que a persegue desde que se entende por gente. Quem nunca sentiu que era o ímã para as desventuras, que atire a primeira pedra… ou o primeiro gato preto, sei lá.
Aislinn Derbez, gente, entrega uma Sara que é impossível não se identificar. Ela não é só “azarada”; ela se sente azarada até a alma, e essa percepção colore cada uma de suas ações e reações. Você vê no olhar dela a resignação antes mesmo que o próximo tropeço aconteça. É quase como se ela estivesse esperando, de braços cruzados, pelo próximo obstáculo que o universo fará questão de jogar em seu caminho. Essa é a beleza da atuação dela: não é a simples enumeração de eventos ruins, mas a forma como a personagem internaliza e projeta essa ideia de “fatalidade” em sua vida.
A trama, um prato cheio de romance e comédia, ganha um tempero especial quando Lucy (a sempre carismática Renata Notni), a irmã mais nova de Sara, aparece com uma notícia bombástica: ela está noiva! E não é de qualquer um. É do crush de Sara da época da escola, Roberto (Giuseppe Gamba), aquele amor platônico que ficou guardado numa caixa empoeirada de “e se”. Poxa vida, não bastasse a sensação de que nada dá certo pra ela, agora a irmã vai casar com o seu crush?! É o tipo de situação que faz você querer sentar ao lado de Sara, oferecer um ombro amigo e uma caixa de chocolate, enquanto ela solta um longo e dramático suspiro.
| Atributo | Detalhe |
|---|---|
| Diretora | Elisa Miller |
| Roteiristas | Marcelo Tobar, Fernanda Eguiarte |
| Elenco Principal | Aislinn Derbez, Renata Notni, Carmen Madrid, Giuseppe Gamba |
| Gênero | Romance, Comédia |
| Ano de Lançamento | 2022 |
| Produtora | Perro Azul |
O filme, uma produção da Perro Azul, navega por essa premissa com uma leveza que desarma. Não é sobre grandes tragédias, mas sobre os pequenos dramas cotidianos que, na nossa cabeça, se transformam em montanhas intransponíveis. A comédia surge não de piadas forçadas, mas da própria condição de Sara, da sua forma peculiar de lidar com os reveses. É um humor mais de situação, de constrangimento e daquela risada nervosa que a gente solta quando algo dá tão errado que só resta rir.
A química entre o elenco é palpável. Renata Notni traz para Lucy uma espontaneidade que contrasta bem com a introspecção de Sara. Lucy é a luz que, ironicamente, às vezes ofusca a irmã, mas sem ser uma vilã. E Carmen Madrid, como Patricia, a mãe, adiciona camadas importantes à dinâmica familiar, mostrando como as expectativas e comparações familiares podem, sutilmente, moldar a percepção que temos de nós mesmos.
Que Culpa Tem o Carma? não é apenas uma comédia romântica despretensiosa. Ele nos faz uma pergunta que, volta e meia, todos nós fazemos a nós mesmos: até que ponto somos vítimas do destino, e até que ponto somos arquitetos (ou sabotadores) da nossa própria felicidade? Sara precisa parar de apontar o dedo para um carma imaginário e começar a olhar para dentro. É um processo doloroso, mas também libertador, e o filme nos acompanha nessa jornada com uma sensibilidade que me pegou de surpresa.
Não espere um tratado filosófico sobre o livre-arbítrio, mas sim uma história divertida e honesta sobre autodescoberta. É como um espelho que, de repente, nos mostra as nossas próprias desculpas, os nossos medos mascarados de “azar”. Porque, no fim das contas, o carma, seja ele bom ou ruim, talvez tenha muito mais a ver com as escolhas que fazemos (ou deixamos de fazer) do que com qualquer força mística que nos persegue. E essa é a beleza e a verdade atemporal que Que Culpa Tem o Carma? me deixou, muito depois dos créditos rolarem. É um filme para rir, suspirar e, quem sabe, repensar um pouquinho as nossas próprias “maldições” pessoais.




