Ah, a reputação. Uma palavra que, por si só, já carrega um peso enorme, não é? Pense bem: é algo construído tijolo por tijolo ao longo de uma vida, mas que pode ruir como um castelo de cartas com uma brisa inesperada, ou, pior ainda, com um terremoto autoimposto. Por que eu, você, nós nos importamos tanto com isso? Porque a reputação não é apenas o que os outros pensam de nós; é o espelho onde nossa identidade profissional e social se reflete, distorcida ou não. E é exatamente essa a lente que Reputação, o filme de Sönke Wortmann lançado em 2020, me convida a usar para enxergar não só a tela, mas também um pedaço do mundo e, talvez, de nós mesmos.
O que me atraiu a escrever sobre Reputação hoje, em meados de outubro de 2025, é a atemporalidade da sua premissa e a inteligência com que ela se desenrola. Num mundo onde “cancelamento” é quase um esporte, o filme nos joga numa situação que, de tão incômoda, é quase palpável. Imagine só: Richard Pohl (interpretado com uma mistura exímia de arrogância e fragilidade por Christoph Maria Herbst), um professor de direito desses que se acham o dono da verdade e da sala, solta um comentário racialmente discriminatório durante uma palestra. O resultado? Não é um fim de carreira abrupto, mas sim uma penitência peculiar: ele é obrigado a orientar Naima Hamid (a brilhante Nilam Farooq), justamente a estudante que ele ofendeu, para uma competição de debates. É um escândalo público que se transforma numa terapia forçada, um ringue de boxe intelectual com regras de etiqueta.
E aqui reside a magia e a complexidade de Reputação. Não é uma história de redenção simplista, dessas que a gente já sabe o final antes mesmo do primeiro ato. Longe disso. É um mergulho em águas turvas, onde a “comédia” serve como boia para não nos afogarmos no drama pesado. As sacadas inteligentes do roteiro de Doron Wisotzky nos pegam de surpresa, fazendo a gente rir quando, talvez, devesse só ficar indignado. O humor, muitas vezes ácido, surge do contraste entre a postura pomposa de Pohl e a resiliência afiada de Naima. Ele é um leão de chácara em jaula de ouro, ela, uma esgrimista pronta para qualquer golpe.
A dinâmica entre Richard e Naima é o coração pulsante do filme. Christoph Maria Herbst, com sua veia cômica inconfundível, não se limita a um vilão unidimensional. Há momentos em que você vê os tiques de um homem que construiu sua vida em torno de uma imagem de infalibilidade e que, agora, vê cada pilar dessa estrutura ser questionado. Ele não muda da noite para o dia; é um processo lento, doloroso, cheio de recuos e avanços. Já Nilam Farooq, como Naima, entrega uma performance que é pura força. Ela não é passiva, nem busca piedade. Sua inteligência e sua dignidade são suas maiores armas. Você sente a faísca nos olhos dela, a forma como ela absorve a toxicidade e a transforma em argumentos cortantes, mostrando que a verdadeira reputação não se compra com títulos, mas se ganha com caráter.
| Atributo | Detalhe |
|---|---|
| Diretor | Sönke Wortmann |
| Roteirista | Doron Wisotzky |
| Produtores | Christoph Müller, Tom Spiess |
| Elenco Principal | Nilam Farooq, Christoph Maria Herbst, Hassan Akkouch, Ernst Stötzner, Meriam Abbas |
| Gênero | Comédia, Drama |
| Ano de Lançamento | 2020 |
| Produtoras | Constantin Film, SevenPictures Film |
A maestria de Sönke Wortmann na direção está em equilibrar esses tons. A gente vê a tensão palpável nos olhares entre Pohl e Naima, quase sente a eletricidade nos ambientes fechados onde eles são forçados a conviver. Mas, então, vem uma frase de efeito, um momento de absurdo, e a sala se enche de um riso nervoso, um respiro necessário. O filme não tem medo de mostrar a feiura do preconceito, mas também não se rende a ela. Ele nos inspira, sim, mas de uma maneira sutil, quase em segundo plano, ao nos mostrar a capacidade humana de desafiar os próprios limites e, quem sabe, de crescer. Não é uma inspiração grandiosa, daquelas com trilha sonora de violinos, mas sim a que se encontra na perseverança e na luta por um espaço justo.
Produtores como Christoph Müller e Tom Spiess, junto às produtoras Constantin Film e SevenPictures Film, certamente entenderam que esta não era apenas mais uma história, mas um comentário perspicaz sobre a sociedade e suas falhas. O elenco coadjuvante, com Hassan Akkouch como Mo e Meriam Abbas como Lial Hamid, adiciona camadas de autenticidade à jornada de Naima, mostrando o suporte e a cultura que a moldam. Ernst Stötzner, como o Presidente Lambrecht, personifica a instituição que tenta, a duras penas, equilibrar a balança da justiça e da imagem.
Reputação me fez pensar sobre o poder das palavras – tanto para ferir quanto para curar, para dividir quanto para conectar. E me fez refletir sobre a diferença entre uma reputação construída em bases frágeis de poder e privilégio, e uma reputação que se ergue sobre a força da verdade e da integridade. É um filme que, sem ser didático demais, nos convida a uma autocrítica. Afinal, nossas reputações, como as de Richard e Naima, estão constantemente em jogo, e a forma como jogamos as cartas, ou as palavras, pode definir quem realmente somos. É uma experiência cinematográfica que ressoa muito além dos créditos finais, um lembrete vívido de que a vida real, assim como a arte, é cheia de nuances, imperfeições e a constante possibilidade de um debate inesperado.




