Sabe, há algo de profundamente cativante nas histórias de origem. Elas nos puxam para o ventre do mito, para o momento antes da lenda, quando o herói ou, neste caso, a figura folclórica, ainda estava se forjando em meio às brasas da vida comum. É por isso que, quando me deparei com a prequela de “A Lenda da Befana”, batizada de A Lenda da Befana: O Início, meu coração de cinéfilo e, mais ainda, meu espírito saudosista de criança que um dia acreditou em tudo, deu um pulinho de entusiasmo. Afinal, quem é que nunca se perguntou como a bruxa boa que entrega doces e carvão nas chaminés surgiu? É essa curiosidade inerente à natureza humana que nos atrai para a tela, buscando as sementes de algo que já conhecemos como grandioso. E olha, essa jornada de 2021, que revisito agora em 2025, ainda pulsa com uma magia que me faz sorrir.
A diretora Paola Randi, com a ajuda dos roteiristas Menotti e Nicola Guaglianone, nos leva para um passado onde a figura da Befana não era mais do que um sussurro no vento. É aqui que conhecemos Paola Diotallevi (interpretada pela jovem Zoe Massenti), uma alma corajosa demais para os padrões de sua época, prestes a ser consumida pela fogueira da superstição. E é nesse momento de desespero que surge Dolores, uma feiticeira enigmática e de presença inegável, trazida à vida por ninguém menos que Monica Bellucci. O resgate de Paola não é apenas um ato de heroísmo, é o ponto de partida para um aprendizado que transformará uma menina em uma das bruxas mais esperadas pela criançada. É como ver um broto em formação, sabendo que um dia ele será uma árvore centenária, cheia de histórias em suas folhas.
Monica Bellucci, minha gente, é um espetáculo à parte. Ela não interpreta Dolores; ela é Dolores. Com aquele olhar penetrante, uma serenidade que esconde um poder ancestral e um sorriso que pode ser doce ou ameaçador, dependendo da circunstância, Bellucci encarna a mentora de forma sublime. Não é uma bruxa de contos de fadas açucarados, mas uma figura de sabedoria e força, que carrega o peso da história e a leveza da magia. Sua Dolores é uma teia complexa de mistério e afeto, capaz de ensinar sem perder a imponência, uma verdadeira bruxa que comanda a tela com cada gesto e cada inflexão de voz. A química entre ela e Zoe Massenti é palpável, transformando o “mestre e aprendiz” em uma dança de descobertas mútuas, onde a experiência e a inocência se encontram.
Zoe Massenti, por sua vez, carrega a Paola com uma doçura e uma rebeldia que nos conquistam. Ela não é uma protagonista passiva; vemos seu coração pulsando, sua curiosidade ardendo, seus medos e suas asperezas à flor da pele. A jornada de Paola é de autodescoberta e empoderamento, uma metáfora linda sobre encontrar seu lugar no mundo e aceitar quem você é, mesmo que isso signifique ser diferente. É a clássica história de amadurecimento, mas banhada em um caldeirão de fantasia e gargalhadas, uma receita que a produção da Lucky Red, RAI e Sky Cinema soube temperar muito bem.
Atributo | Detalhe |
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Diretora | Paola Randi |
Roteiristas | Menotti, Nicola Guaglianone |
Produtores | Andrea Occhipinti, Stefano Massenzi, Mattia Guerra |
Elenco Principal | Monica Bellucci, Zoe Massenti, Fabio De Luigi, Herbert Ballerina, Alessandro Haber |
Gênero | Família, Fantasia, Comédia |
Ano de Lançamento | 2021 |
Produtoras | Lucky Red, RAI, Sky Cinema |
E por falar em gargalhadas, o filme abraça seus gêneros de Família, Fantasia e Comédia com um entusiasmo contagiante. Não é uma comédia que se leva a sério demais, mas também não é infantilizada. Fabio De Luigi, como o Barone Gian Rodolfo De Michelis, e Herbert Ballerina, como Marmotta, são as injeções perfeitas de alívio cômico, com suas excentricidades e trapalhadas que arrancam risadas genuínas. Alessandro Haber, no papel do Marchese, adiciona uma camada de seriedade e antagonismo que, de alguma forma, só ressalta a leveza geral. É essa mistura de elementos que impede que o filme caia na armadilha do previsível, mantendo o espectador, seja ele criança ou adulto, engajado e divertido.
A direção de Paola Randi é como um abraço quentinho, que nos envolve em um mundo visualmente rico, cheio de detalhes que remetem à velha Europa e à magia do folclore. A fotografia, os figurinos, tudo contribui para criar um universo crível e mágico, onde o voo de vassoura é tão natural quanto respirar. O ritmo da narrativa flui como um rio que ora corre em corredeiras, ora desliza em águas mansas, garantindo que não haja monotonia. A gente sente o cheiro da floresta, o calor da fogueira, a brisa fria das noites mágicas.
A Lenda da Befana: O Início é mais do que uma prequela; é uma carta de amor à imaginação, àqueles que ousam sonhar e que, por vezes, são salvos por figuras inesperadas que veem além das convenções. É uma celebração do que significa ser uma “bruxa” – não um ser maligno, mas uma guardiã de segredos, uma portadora de conhecimento, e sim, uma distribuidora de esperança, ou de carvão, dependendo do mérito. É um filme que, mesmo alguns anos após seu lançamento, em 2021, continua a me lembrar da força das histórias e do poder transformador de um bom coração, seja ele adornado por um chapéu pontudo ou não. E isso, para mim, tá longe de ser uma mera lenda. É a pura verdade.