Anora

Anora: Um conto de fadas moderno com dentes afiados

Lançado em 23 de janeiro de 2025 no Brasil, Anora chegou às telas como um sopro de ar fresco, um turbilhão de comédia, drama e romance que não se encaixa facilmente em nenhuma caixa. Dirigido e escrito por Sean Baker, o filme acompanha Ani, uma jovem e vibrante profissional do sexo no Brooklyn, cujo encontro casual com Ivan, filho de um oligarca russo, a catapulta para um casamento impulsivo que rapidamente se transforma em um caos hilário e, por vezes, angustiante. A chegada dos pais de Ivan a Nova Iorque para desfazer a união promete uma avalanche de confusões culturais e momentos explosivos. A premissa, claramente inspirada no conto de Cinderela, é subvertida com uma dose generosa de realismo cru, explorando temas complexos com um humor mordaz e um toque de coração.

A direção de Sean Baker é, como sempre, impecável. Sua capacidade de capturar a energia bruta e a beleza áspera de Nova Iorque é notável, transformando as ruas movimentadas do Brooklyn e a opulência de uma mansão em personagens coadjuvantes. A câmera se move com uma agilidade quase documental, nos colocando no meio da ação, sem nunca perder o foco na jornada emocional de Ani. A escolha das locações, incluindo Coney Island, o metrô de Nova Iorque e até mesmo o próprio City Hall, contribui para a atmosfera vibrante e autêntica do filme. Baker tem um talento único para mostrar a beleza nos lugares inusitados e nos personagens marginalizados, encontrando poesia na realidade cotidiana.

O roteiro é inteligente e bem escrito, alternando entre momentos de comédia pastelão e reflexões mais profundas sobre classe social, identidade e a busca pela felicidade. A dinâmica entre Ani e Ivan é complexa e cativante, mesclando a inocência quase infantil de ambos com o peso da responsabilidade de um casamento precipitado. Mikey Madison entrega uma performance extraordinária como Ani, transmitindo vulnerabilidade e força em igual medida. Sua Ani é corajosa, divertida e um pouco tola, mas acima de tudo, extremamente humana. Mark Eydelshteyn, como Ivan, equilibra bem a imaturidade e a confusão do personagem com momentos de genuína afeição. O elenco de apoio, incluindo Youri Borissov, Karren Karagulian e Vache Tovmasyan como os pais de Ivan, adiciona uma camada rica e caricatural à narrativa.

Apesar de suas qualidades inegáveis, Anora não está isento de falhas. Em alguns momentos, o ritmo pode parecer irregular, e a trama se estende um pouco mais do que o necessário. Algumas piadas, apesar de bem-intencionadas, não funcionam tão bem, e há um ou dois momentos em que o tom se desequilibra. Mas, no geral, os pontos fortes superam os fracos.

Anora é mais do que uma simples comédia romântica. Ele explora temas relevantes com inteligência e sensibilidade, como a exploração sexual, as diferenças de classe e a pressão familiar. O filme nos convida a refletir sobre a construção de identidades e a busca por pertencimento, sem simplificar as realidades complexas dos personagens. A mensagem central, que a felicidade verdadeira se encontra na autenticidade e na capacidade de seguir o próprio caminho, ressoa fortemente, mesmo com o final um tanto previsível.

Em retrospectiva, analisando quase um ano depois de seu lançamento, a recepção crítica a Anora foi, no geral, positiva, com muitos elogiando a direção, a atuação de Madison e a abordagem única do conto de fadas clássico. O filme, apesar de algumas críticas a respeito de seu ritmo, consolidou-se como um título memorável de 2025, e acredito que irá continuar a ser apreciado nas plataformas digitais por muitos anos. Recomendo Anora a todos que apreciam comédias inteligentes, dramas emocionantes e uma boa dose de realismo cru. É uma película que certamente ficará gravada na memória, mesmo com suas imperfeições. Um filme para ser visto, discutido e apreciado em toda sua complexidade.