Noites Brutais

Sabe, há filmes que a gente assiste e eles se dissolvem na memória como açúcar em água. E há outros que, por mais que tentemos, simplesmente se recusam a nos largar. Noites Brutais, ou “Barbarian”, como é conhecido lá fora, é um desses últimos para mim. Já se vão quase três anos desde que ele aterrorizou as salas de cinema no Brasil, em outubro de 2022, e ainda hoje, quando penso em terror que realmente me impactou, o enredo maluco de Zach Cregger ecoa pelos meus corredores mentais. É por isso que sinto uma necessidade quase visceral de falar sobre ele novamente, de destrinchar essa criatura cinematográfica que desfilou pela minha tela e mudou a forma como encaro o gênero.

Quando Noites Brutais apareceu nos meus radares, minha primeira reação foi a típica de um cinéfilo calejado: “Ah, mais um filme sobre aluguel de temporada que dá errado. Devo ter visto uns dez assim só no ano passado.” E, para ser bem franco, a sinopse não fazia muito para dissipar essa impressão. Tess (Georgina Campbell), uma jovem mulher chegando a Detroit para uma entrevista de emprego, aluga uma casa. Chega tarde da noite e descobre que a casa já está ocupada por um homem estranho, Keith (Bill Skarsgård). Contra todo bom senso que você e eu gritamos para a tela, ela decide passar a noite. Aí a gente pensa: “Ok, sei o que vai acontecer. Suspense psicológico, talvez um serial killer, aquelas coisas.” Mas é aí que o filme, com um sorriso distorcido, arranca o tapete debaixo dos nossos pés e nos joga num labirinto onde cada curva revela uma nova aberração.

A genialidade de Zach Cregger, diretor e roteirista – um nome que muitos conhecem por seu trabalho em comédia, o que torna a brutalidade e a astúcia deste filme ainda mais chocantes – começa nessa premissa enganosamente familiar. A tensão inicial entre Tess e Keith é palpável. O ar fica denso com a paranoia. É Skarsgård no seu melhor “estranho mas talvez inofensivo?” que nos deixa na ponta da cadeira, ponderando se a ameaça é real ou apenas a ansiedade de Tess. E, claro, quando os segredos do porão começam a vir à tona, a gente pensa: “Agora sim! O filme vai seguir esse trilho de horror de sobrevivência.”

E aí, bum.

AtributoDetalhe
DiretorZach Cregger
RoteiristaZach Cregger
ProdutoresArnon Milchan, Raphael Margules, J.D. Lifshitz, Roy Lee
Elenco PrincipalGeorgina Campbell, Justin Long, Bill Skarsgård, Richard Brake, Matthew Patrick Davis
GêneroTerror, Thriller
Ano de Lançamento2022
ProdutorasBoulderLight Pictures, Vertigo Entertainment, Regency Enterprises, Hammerstone Studios, Almost Never Films

O filme muda de marcha de uma forma tão audaciosa que eu me peguei rindo de nervoso na sala escura. A introdução de AJ (Justin Long), um ator que eu sempre tive apreço, especialmente depois de vê-lo em coisas como “Olhos Famintos” lá atrás, é um ponto de virada que redefine completamente a narrativa. AJ é um tipo diferente de “monstro”, se é que me entendem. Ele é o arquétipo do homem privilegiado e narcisista, envolvido em acusações de conduta imprópria que ressoam com as discussões sobre o movimento MeToo, e sua chegada ao cenário da casa alugada adiciona camadas de comentário social ao terror visceral que já se desenrolava. Suas cenas são, ironicamente, algumas das mais perturbadoras, não pela violência explícita (que há), mas pela forma como revelam a banalidade do mal e a cegueira de certos indivíduos. Cregger nos faz questionar: quem é o verdadeiro monstro aqui? O que espreita nas sombras ou a escuridão que carregamos dentro de nós?

A construção do terror é uma aula de “mostrar, não contar”. As mãos de Tess tremendo enquanto segura a maçaneta, o som abafado de algo se arrastando no porão, o cheiro de mofo e desespero que quase podemos sentir através da tela. Não são apenas jump scares; é uma atmosfera ghoulish, um sentimento de opressão constante que permeia cada quadro. A casa em Detroit não é apenas um cenário; é uma entidade viva, com seus corredores claustrofóbicos, um quarto secreto que guarda segredos abjetos e, claro, o temível porão, onde reside A Mãe (interpretada de forma perturbadora por Matthew Patrick Davis) e onde a verdadeira história de horror serial killer de Frank (Richard Brake) é revelada através de flashbacks fragmentados e angustiantes.

Georgina Campbell carrega o peso do filme com uma vulnerabilidade e uma força incríveis, tornando Tess uma heroína improvável, mas totalmente crível. Ela é o nosso guia através desse pesadelo. E Justin Long, meu Deus, ele abraça a repulsa de seu personagem com uma coragem que só um ator de verdade consegue. Não é uma performance para “gostar” do personagem, mas para entender a escuridão que ele representa.

Noites Brutais é uma experiência cinematográfica que desafia categorização. É terror, é thriller, é comentário social, é uma bofetada na cara das expectativas. É uma daquelas raras obras que, ao terminar, nos deixa com uma sensação de desorientação, com a cabeça fervilhando de perguntas e imagens perturbadoras. A cada reviravolta, Cregger não está apenas tentando nos assustar; ele está nos provocando, nos manipulando, nos forçando a confrontar os horrores que se escondem tanto nos cantos mais sombrios da sociedade quanto nos corredores empoeirados de uma casa alugada por Airbnb. E sim, até mesmo depois dos créditos, há um lembrete sutil de que algumas brutalidades persistem, ecoando em silêncio.

Se você procura um filme que se encaixe confortavelmente nas suas expectativas de terror, Noites Brutais não é para você. Mas se você está pronto para uma viagem inesperada, brutalmente original e profundamente inquietante, que te deixará pensando muito depois que as luzes se acenderem, então, meu amigo, prepare-se. Esta é uma noite que você não vai esquecer.

Trailer

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