Clotilda: Um mergulho necessário, mas imperfeito, nas profundezas do horror
Lisa Feit nos entrega em Clotilda: O Último Barco de Escravos um documentário que, apesar de suas imperfeições, é essencial para qualquer um que busque compreender a brutalidade da escravidão americana. O filme narra a história da chegada de 110 africanos ao Alabama em 1860, a bordo do navio Clotilda, e o subsequente trabalho arqueológico que trouxe à tona os destroços desta embarcação, um macabro monumento à tragédia humana. A narrativa, sem se perder em detalhes desnecessários, tece uma trama que equilibra os relatos históricos com a emoção do processo de descoberta arqueológica.
A direção de Feit, apesar de não ser revolucionária em termos técnicos, é eficaz em seu propósito. A construção da narrativa é linear, mas isso funciona a favor do filme, permitindo que a gravidade dos eventos se instale gradativamente no espectador. Não há floreios estéticos desnecessários, o foco é no conteúdo, no peso da história que está sendo contada. O filme se apoia em imagens de arquivo, reconstituições e entrevistas com historiadores e arqueólogos que, apesar de terem uma presença um tanto acadêmica, transmitem com paixão a importância da descoberta e da preservação da memória. A edição, precisa e contida, guia o espectador de forma natural, evitando o sensacionalismo barato e a exploração gratuita do sofrimento.
A força do filme reside precisamente em suas entrevistas. Sylviane Diouf, Natalie S. Robertson, Mary Elliott, James P. Delgado e Stacye Hathorn, entre outros, trazem à luz não apenas os aspectos históricos da tragédia, mas também as implicações sociais e emocionais de uma ferida que continua a sangrar. As atuações, se é que podemos chamar assim, são genuínas e autênticas, conduzidas pela emoção genuína dos entrevistados. São os seus rostos, a sua dor, e a sua luta por justiça e por memória que realmente nos tocam.
| Atributo | Detalhe |
|---|---|
| Diretor | Lisa Feit |
| Produtor | Lisa Feit |
| Elenco Principal | Sylviane Diouf, Natalie S. Robertson, Mary Elliott, James P. Delgado, Stacye Hathorn |
| Gênero | Documentário |
| Ano de Lançamento | 2022 |
| Produtora | National Geographic |
Entretanto, o filme também apresenta algumas fragilidades. A abordagem acadêmica, por vezes, pode tornar a narrativa um pouco densa para aqueles que não estão familiarizados com o contexto histórico da escravidão nos Estados Unidos. Apesar da sinopse apresentar a arqueologia como foco, essa abordagem poderia ter sido explorada com maior profundidade, mostrando mais detalhes do trabalho de campo e dos desafios enfrentados pelos arqueólogos. Uma maior integração de imagens de animação ou reconstituições poderia tornar a experiência mais imersiva e emocionalmente impactante.
Clotilda: O Último Barco de Escravos não é um documentário que nos deixa confortáveis. Ele nos confronta com a dura realidade de um passado brutal e de um presente ainda marcado pelas suas consequências. É um filme que provoca reflexão, que nos força a confrontar a nossa própria história e a nossa responsabilidade coletiva em relação à justiça social e racial. Apesar de suas pequenas falhas, o filme cumpre seu propósito: nos lembrar do horror da escravidão e da importância da preservação da memória para construir um futuro mais justo e equitativo. Recomendo fortemente sua visualização, especialmente para aqueles que buscam um aprofundamento na história da escravidão americana e na luta contínua pela reparação histórica. Aquele que espera um espetáculo visual ficará talvez decepcionado, mas quem busca uma experiência que lhe cause uma profunda e necessária reflexão, encontrará em “Clotilda” uma obra essencial.




