Sabe aquela sensação? Aquela vontade de largar tudo, nem que seja por um instante, e só… ser você mesmo de novo? Para quem vive a rotina de cuidar da casa, dos filhos, de todas aquelas mil e uma tarefas que parecem nunca ter fim, “tempo para mim” é quase uma lenda urbana. Por isso, quando me deparei com a premissa de De Férias da Família – ou ‘Me Time’, como o original americano tão bem intitula –, um filme de 2022 que, por aqui, a gente só acessou via streaming, meu interesse foi instantâneo. Afinal, quem, em sã consciência, não sonha com uma escapada dessas? Especialmente nós, que em algum momento, já nos vimos afogados em responsabilidades.
O filme nos joga de cabeça na vida de Sonny Fisher, interpretado com aquela energia inconfundível por Kevin Hart. Sonny é um pai dono de casa em tempo integral, e veja bem, não é um trabalho para os fracos. Ele é o capitão do navio doméstico, o estrategista das festinhas de aniversário temáticas, o guardião da programação das crianças. É uma vida cheia de amor, sim, mas também exaustiva, com pouco espaço para o indivíduo Sonny que existia antes das fraldas e dos deveres de casa. Seu olhar, muitas vezes, carrega o peso de quem faz malabarismos com pratos invisíveis o dia inteiro.
Eis que o universo, em um ato de benevolência (ou de ironia, dependendo do ponto de vista), decide dar a ele uma trégua. Sua esposa, Maya (Regina Hall, a âncora de bom senso da história), e os filhos, Dashiell e Ava, viajam, deixando Sonny sozinho em casa. Pensa só: uma casa vazia, sem gritos, sem demandas, sem a necessidade de negociar o brócolis do jantar. É um convite ao caos controlado, ou pelo menos, a uma tentativa de reconexão com o eu que Sonny deixou em algum lugar no passado.
Mas a vida, a gente sabe, tem um roteiro próprio, e o de Sonny é atropelado pelo reaparecimento de Huck Dembo, o melhor amigo das antigas, um espírito livre e indomável vivido por Mark Wahlberg. Huck é tudo que Sonny não é mais: espontâneo, irresponsável e com uma capacidade única de transformar um simples encontro em uma sequência de eventos digna de um filme de ação – ou, no caso, de comédia. A dinâmica entre Hart e Wahlberg é o motor dessa “buddy comedy”, com Hart sendo o lado neurótico e hesitante, e Wahlberg o catalisador da loucura. A química entre eles, se não é revolucionária, ao menos é funcional, remetendo a duplas cômicas clássicas onde o contraste é a estrela. Você se pega imaginando qual absurdo Huck vai aprontar a seguir, e como Sonny, com sua postura certinha, vai se safar (ou não) dessa vez.
Atributo | Detalhe |
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Diretor | John Hamburg |
Roteirista | John Hamburg |
Produtores | Kevin Hart, John Hamburg, Bryan Smiley |
Elenco Principal | Kevin Hart, Mark Wahlberg, Regina Hall, Luis Gerardo Méndez, Jimmy O. Yang, Che Tafari, Amentii Sledge, Diane Delano, Kamilah Michelle Hatcher, Jai Carter |
Gênero | Comédia |
Ano de Lançamento | 2022 |
Produtoras | Particular Pictures, HartBeat Productions |
O roteiro, assinado pelo próprio diretor John Hamburg – conhecido por comédias que brincam com a amizade masculina, como ‘Eu Te Amo, Cara’ –, nos leva por um final de semana que começa com a promessa de liberdade e termina quase virando a vida de Sonny de cabeça para baixo. Há momentos de riso genuíno, especialmente na forma como a vida pacata de Sonny é posta em xeque pelas excentricidades de Huck, que inclui desde festas em iates a encontros com figuras peculiares como Armando Zavala (Luis Gerardo Méndez), que adiciona uma camada de comédia física e uma certa dose de perigo às desventuras. Há um quê de nostalgia, um aceno para aqueles que já sentiram a tentação de revisitar uma fase mais despreocupada da vida, antes que as responsabilidades nos ancorassem firmemente no presente.
Não vou mentir, De Férias da Família não reinventa a roda da comédia. Há clichês, sim, momentos previsíveis e algumas piadas que você vê chegando a quilômetros de distância. A jornada de Sonny é, em essência, uma parábola sobre o equilíbrio: como amar sua vida atual sem perder completamente o contato com quem você era e, mais importante, com quem você ainda pode ser, mesmo com todas as novas obrigações. Regina Hall, no papel de Maya, embora com menos tempo de tela, consegue transmitir a sabedoria e o amor inabalável que servem de bússola para Sonny, mesmo quando ele está completamente perdido no redemoinho de Huck.
E é aí que o filme, para mim, encontra sua humanidade. Não é apenas sobre Kevin Hart caindo e gritando (embora ele faça isso muito bem). É sobre o reconhecimento daquele pequeno grito silencioso que muitos pais e mães guardam: o desejo de um tempo para si, de um reencontro com a própria essência, de uma pausa na incessante demanda de cuidar dos outros. É sobre a amizade, a lealdade, e o quão longe estamos dispostos a ir (ou a não ir) para reviver um pedaço do passado.
No fim das contas, De Férias da Família é como aquela cerveja gelada num dia quente de trabalho: talvez não seja a mais sofisticada, mas cumpre o que promete – um respiro, umas boas risadas e, quem sabe, um empurrãozinho para a gente se lembrar que o “tempo para mim” não precisa ser épico e perigoso como o de Sonny Fisher. Às vezes, só uns minutinhos de silêncio já resolvem. E é um lembrete valioso, especialmente agora, em 2025, quando a vida continua correndo, e o tempo para nós mesmos parece cada vez mais precioso.