O Sonho Americano Desmorona: Uma Retrospectiva de Não Se Preocupe, Querida
Três anos após sua estreia, Não Se Preocupe, Querida (Don’t Worry Darling) continua a ser um filme que provoca debate e divide opiniões – e, sinceramente, é exatamente isso que um bom thriller psicológico deve fazer. Dirigido por Olivia Wilde e escrito por Katie Silberman, este longa-metragem de 2022 nos transporta para um idílio suburbano que é, ao mesmo tempo, sedutor e profundamente perturbador.
A Fachada de Perfeição em Victory
A premissa é simples, mas instigante: Alice (Florence Pugh) e Jack (Harry Styles) são um casal aparentemente feliz vivendo na comunidade utópica de Victory, uma cidade experimental nos anos 50. Lá, os homens trabalham em um projeto ultrassecreto, enquanto suas esposas cuidam da casa, preparam jantares elaborados e participam de coquetéis à beira da piscina. É um paraíso de gramados verdes impecáveis, carros clássicos e uma vida doméstica cuidadosamente orquestrada, liderada pelo carismático e enigmático Frank (Chris Pine).
| Atributo | Detalhe |
|---|---|
| Diretora | Olivia Wilde |
| Roteirista | Katie Silberman |
| Produtores | Miri Yoon, Roy Lee, Olivia Wilde, Katie Silberman |
| Elenco Principal | Florence Pugh, Harry Styles, Chris Pine, Olivia Wilde, KiKi Layne |
| Gênero | Ficção científica, Mistério, Thriller |
| Ano de Lançamento | 2022 |
| Produtoras | Vertigo Entertainment, New Line Cinema |
Contudo, a perfeição tem seu preço, e Alice logo começa a notar rachaduras nessa fachada imaculada. Flashes de algo sinistro emergem, questionando a realidade de Victory e o propósito do Projeto ultrassecreto. O que eles estão realmente fazendo ali? E, mais importante, por que estão ali? Este mistério é o motor do filme, puxando o espectador para uma jornada de desconfiança e revelações chocantes.
Uma Direção Estilosa e Atuações Cativantes, Mas um Roteiro Familiar
Quando Não Se Preocupe, Querida foi lançado, a conversa pré-filme foi tão intensa quanto o filme em si. Mas, ao vê-lo com a distância de alguns anos, livre do burburinho externo, posso dizer que o filme merece ser avaliado por seus próprios méritos – e deméritos.
Olivia Wilde, como diretora, demonstra um olho afiado para a estética. A recriação dos anos 50, com suas cores vibrantes, arquitetura glamourosa de Palm Springs e figurinos impecáveis, é um espetáculo visual. Ela constrói uma atmosfera claustrofóbica sob um céu ensolarado, utilizando a beleza para disfarçar o pavor. Wilde consegue criar uma tensão palpável, permeando cada cena com a sensação de que algo está fundamentalmente errado. Sua direção é audaciosa, com sequências oníricas que reforçam o estado mental desequilibrado de Alice.
O roteiro de Katie Silberman, por outro lado, é onde o filme tropeça um pouco para quem já tem um bom repertório de thrillers. Há uma certa previsibilidade na trama que lembra clássicos como “As Esposas de Stepford” (2004) e até mesmo “O Show de Truman” (1998), como alguns críticos apontaram. E sim, a sensação de que o filme é um “híbrido” dessas ideias é inegável. A jornada de Alice, a “esposa infeliz” que desvenda a verdade por trás do “culto” suburbano, pode soar familiar. A reviravolta final, embora impactante, não entrega o choque de originalidade que se esperaria de um mistério que se vende como ficção científica.
No entanto, mesmo com o roteiro pisando em terreno conhecido, as atuações elevam a experiência. Florence Pugh entrega uma performance verdadeiramente fenomenal. Alice é a âncora emocional do filme, e Pugh carrega o peso de sua crescente paranoia e desespero com uma intensidade crua e visceral. Seus gritos, seus olhos arregalados de terror e sua determinação em desvendar a verdade são o coração pulsante da narrativa. Harry Styles, como Jack, surpreende ao dar profundidade a um personagem complexo, alternando entre o charme sedutor e um comportamento mais sombrio. E Chris Pine, como o vilanesco Frank, é magnético. Ele exala um controle calmo e manipulador que é tanto fascinante quanto aterrorizante. Olivia Wilde, em seu papel como Bunny, também contribui com uma performance notável, cheia de nuances.
Temas e Mensagens: O Preço da Conformidade
Não Se Preocupe, Querida mergulha em temas potentes, especialmente o controle, a subserviência feminina e o patriarcado disfarçado de paraíso. A “utopia” de Victory é, na verdade, uma prisão dourada, onde as mulheres são mantidas em um papel de servidão demeaning, sem voz ou agência. O filme aborda o conceito de uma “esposa de Stepford” sob uma lente moderna, explorando o desejo masculino de uma realidade domesticada e perfeitamente controlada. A ficção científica e o mistério servem como veículos para questionar a conformidade social e os perigos de abdicar da própria individualidade em nome de uma felicidade imposta.
Pontos Fortes:
Atuação de Florence Pugh: Absolutamente brilhante e carrega o filme.
Estética Visual e Direção de Arte: Deslumbrante e atmosférica, recria a era dos anos 50 com maestria.
Tensão e Atmosfera: A sensação de inquietação é constante, prendendo o espectador.
Temas Relevantes: Provoca reflexão sobre gênero, controle e o poder da realidade construída.
Pontos Fracos:
Originalidade do Roteiro: A trama pode parecer derivada de outros filmes do gênero, especialmente na revelação final.
Ritmo Inconsistente: Embora a tensão seja boa, algumas partes se arrastam antes de engrenar.
Veredito Final: Vale a Pena Mergulhar em Victory?
Apesar de suas falhas no roteiro, Não Se Preocupe, Querida é um filme que, sem dúvida, merece ser visto. Ele não é uma obra-prima intocável, mas é um thriller psicológico eficaz que brilha graças à visão ambiciosa de Olivia Wilde e, principalmente, à atuação monumental de Florence Pugh. É um filme que, como um bom vinho, talvez seja melhor apreciado agora, longe da efervescência inicial e das distrações externas.
Se você busca uma experiência visualmente rica, com atuações de peso e que te faça refletir sobre o “preço da felicidade” e as armadilhas da conformidade, sugiro que dê uma chance a este mergulho inquietante no coração do sonho americano desmoronando. Prepare-se para ser hipnotizado pela estética, perturbado pelos questionamentos e, quem sabe, surpreendido pela força da performance de Alice. Não se preocupe, querida… ou talvez devesse?




