Fabula: Onde Lendas Sussurram e o Crime Dança na Neblina do Interior
Sabe, de vez em quando, a gente esbarra com um filme que parece uma daquelas conversas de bar que começam com “e se…?” e terminam com a cabeça girando e um sorriso bobo. Fabula, de Michiel ten Horn, é exatamente isso para mim. Lançado lá fora há quase seis meses, em 10 de abril de 2025, e ainda sem previsão de chegar por aqui no Brasil, ele já se tornou aquele sussurro entre amigos cinéfilos, a obra que a gente anseia em ver e discutir, porque olha, pelo que se conta, não é pouca coisa, não. É uma pena que, em setembro de 2025, ainda não tenhamos tido a chance de mergulhar de cabeça nessa estranha e fascinante criação. Mas a curiosidade, essa sim, não para de crescer.
Uma Tapeçaria de Lendas, Risadas e Sombras
Imagine um vilarejo qualquer, desses que o tempo parece ter esquecido, onde a turfa úmida do pântano é a principal riqueza, e o burburinho local é mais denso que a neblina matinal. Agora, injete nisso uma dose de crime – daquele tipo que se espalha pelas margens, silencioso, mas letal, muitas vezes alimentado por uma rede de drogas – e uma pitada generosa de folclore, onde as lendas se recusam a ficar nas páginas dos livros, e sim, teimam em andar pelas ruas, talvez até empurrando um carrinho de mão com mercadorias ilícitas. Pois bem, essa é a tela que Michiel ten Horn nos pinta com Fabula.
| Atributo | Detalhe |
|---|---|
| Diretor | Michiel ten Horn |
| Roteirista | Michiel ten Horn |
| Elenco Principal | Fedja van Huêt, Sezgin Güleç, Livia Lamers, Michiel Kerbosch, Anniek Pheifer, Georg Friedrich, David Kross, Victor Löw, Ferhat Kaplan, Yasin Boynuince |
| Gênero | Comédia, Crime, Fantasia |
| Ano de Lançamento | 2025 |
| Produtoras | New Amsterdam Film Company, Fobic Films, 2Pilots Filmproduction |
O que me fisga de cara, e o que me faz coçar a cabeça em pura admiração, é como ten Horn não tem medo de misturar essas tintas. A comédia não é um alívio cômico; ela nasce da bizarrice da situação, do choque entre a realidade mundana e a irrupção do fantástico. O crime, com sua sordidez e suas consequências reais, não é glamouroso; ele é sujo, desesperado, mas se torna quase ridículo quando confrontado com a lógica torta de um mundo onde os mitos são mais presentes que o próprio delegado, onde o lendário Buckrider talvez não seja apenas uma história de terror para crianças, mas uma figura que pode cruzar seu caminho na hora errada. Essa pequena cidade não é apenas um pano de fundo; é um personagem vivo, respirando os segredos e as superstições de seus habitantes.
A Versatilidade que Encarna o Mito
E o elenco, ah, o elenco! Fedja van Huêt é um show à parte, uma espécie de camaleão que atravessa a narrativa em diferentes peles – Jos, o Cortador de Turfa, o Homem Rico, e até o mítico Buckrider. Não é apenas uma proeza técnica de atuação, é uma declaração: as figuras que povoam nossas lendas e nossas vidas cotidianas talvez não sejam tão diferentes assim, talvez sejam apenas diferentes máscaras de uma mesma essência humana, ou quem sabe, arquetípica. Ele encarna a própria alma daquela região, suas aspirações, seus perigos, seus mitos. E Anniek Pheifer, igualmente versátil, ecoa essa ideia, transitando entre papéis como Dien, a Esposa do Homem do Feno e a Esposa do Buckrider, faces diferentes da mesma moeda ancestral que insiste em se manifestar. É como se a própria história daquele lugar estivesse inscrita no corpo e na performance desses atores.
Sezgin Güleç como Özgür e Livia Lamers como Linda trazem um contraponto de humanidade mais “pé no chão”, talvez o elo do espectador com essa realidade emborcada que é Fabula. E quem não fica curioso para ver David Kross, um ator de tanto calibre, interpretando um personagem tão peculiar como “The Grape”? Georg Friedrich como Hendrik, Michiel Kerbosch como Lei, Victor Löw como o Operador de Parque de Diversões, e Ferhat Kaplan e Yasin Boynuince como Abdul e Deniz… É um elenco que grita “personagens”, daqueles que grudam na memória, e não meros coadjuvantes de uma trama genérica. Eles prometem ser a âncora que nos conecta à complexidade humana em meio à extravagância fantástica.
A Visão Singular de um Contador de Histórias
A visão de Michiel ten Horn, que assina tanto a direção quanto o roteiro, é o coração pulsante de Fabula. Ele não se limita a contar uma história; ele nos envolve em um universo onde a lógica é fluida e onde a fronteira entre o real e o imaginário é tão tênue quanto a fumaça de um cigarro. A transição entre o riso desengonçado e o suspense tenso, entre a prosaica negociação de drogas e a aparição de figuras do folclore local, é feita com uma naturalidade tão perturbadora que você se pega pensando: “Será que as lendas urbanas da minha própria cidade não estão apenas esperando o momento certo para se manifestar?” É uma dança delicada, um tango entre o mundano e o mágico, onde cada passo é calculado para desestabilizar e encantar. Sua produção, envolvendo New Amsterdam Film Company, Fobic Films e 2Pilots Filmproduction, sugere um toque europeu que muitas vezes nos presenteia com narrativas mais ousadas e estilizadas.
E aqui, caro leitor, é onde meu coração de cinéfilo aperta. Seis meses se passaram desde que Fabula chegou aos cinemas no exterior, e por aqui? Nada. Nenhuma distribuidora se arriscou a trazer essa joia, esse filme que trafega tão livremente entre gêneros. É uma pena, porque filmes como este, que subvertem expectativas e brincam com a nossa percepção da realidade, são um respiro no mar de produções previsíveis. Fico imaginando as discussões que teríamos nas redes sociais, nos cafés, se pudéssemos compartilhar a experiência coletiva de assistir a essa “fábula” moderna.
No fim das contas, Fabula parece ser mais do que um filme. É um convite para olhar para a nossa própria realidade com outros olhos, para questionar o que é real e o que é lenda, especialmente naquelas pequenas cidades onde os segredos são guardados com unhas e dentes e o tráfico de drogas pode se esconder sob o véu do folclore. É uma obra que, pelo que se desenha, nos lembra que o grotesco pode ser hilário, o místico pode ser terreno, e que, às vezes, o maior crime é ignorar a riqueza das histórias que nos cercam. É um filme que eu, sinceramente, mal posso esperar para finalmente ver. E você, tá comigo nessa curiosidade?




