Garoto chiffon

Sabe quando a gente chega num ponto da vida em que o ar parece rarefeito, as paredes apertam e a cidade grande, que antes era promessa, vira um labirinto sem saída? Eu aposto que você sabe. É essa sensação de desespero abafado, de esgotamento que vem de dentro para fora, que me fisgou em “Garoto Chiffon” – ou, no original, “Chiffon Garçon” – quando o revi há pouco tempo, agora em 2025. O filme, que chegou por aqui em março de 2022, é desses que a gente guarda um cantinho na memória, sabe? E me deu uma vontade incontrolável de destrinchar por que ele ainda ressoa tanto.

Nicolas Maury, um ator que já nos acostumou a personagens complexos e cheios de nuances – e que aqui, veja só, também assume a cadeira de diretor e um dos roteiristas –, nos apresenta Jérémie Meyer. Jérémie é esse jovem que, em Paris, parece estar prestes a implodir. Cada cena com ele, no início, é um nervosismo à flor da pele, um tremor quase imperceptível nas mãos, um olhar que parece sempre desviar, fugindo do contato. Não é só cansaço; é uma espécie de exaustão existencial, profissional e talvez, quem sabe, até emocional. É o tipo de cansaço que te faz querer correr para o único lugar que você jura que te salvará, mesmo sabendo que ele também pode te sufocar: a casa da mãe.

E é aí que Limosin entra em cena, e Nathalie Baye, como Bernadette Meyer, a mãe. Ah, Bernadette! Ela não é simplesmente “intrusiva”; ela é um cometa que entra na órbita de Jérémie com uma força gravitacional avassaladora. Sua intrusão não é má-fé; é uma forma de amor, um amor que se manifesta em perguntas demais, em sugestões não solicitadas sobre a vida amorosa do filho, sobre sua carreira, sobre como ele deveria estar vivendo. Ela não pergunta, ela absorve. Ela não escuta, ela opina. E Maury, na direção, consegue nos mostrar essa dinâmica de uma forma tão visceral que a gente sente o desconforto de Jérémie. A cada suspiro dele, a cada sorriso forçado, a cada tentativa de se defender sem ser agressivo demais, a gente se vê ali, ou reconhece alguém. É uma dança complexa de amor e irritação, um balé agridoce que define muitas relações materno-filiais, especialmente quando o filho já adulto ainda busca a própria voz.

O roteiro, assinado por Maury, Sophie Fillières e Maud Ameline, costura essa complexidade com uma leveza que surpreende, dado o peso dos temas. É um drama que se permite ser hilário, um riso nervoso que surge nas situações mais constrangedoras, quase como um mecanismo de defesa. A comédia não alivia o drama; ela o sublinha, o torna mais humano, mais palatável. Maury, no papel de Jérémie, é uma aula de contenção e explosão, e a gente não consegue tirar os olhos dele. Ver o diretor-ator se desdobrar assim é quase como assistir a uma terapia coletiva, onde ele, na tela, tenta resolver seus próprios dilemas enquanto nos diverte e nos provoca.

AtributoDetalhe
DiretorNicolas Maury
RoteiristasNicolas Maury, Sophie Fillières, Maud Ameline
ProdutorCharles Gillibert
Elenco PrincipalNicolas Maury, Nathalie Baye, Jean-Marc Barr, Arnaud Valois, Théo Christine
GêneroDrama, Comédia
Ano de Lançamento2020
ProdutorasCG Cinéma, Mother Production

E o tema gay, mencionado nas palavras-chave? Ele está ali, claro, mas não é um panfleto. É parte integrante da identidade de Jérémie, um fio delicado em sua tapeçaria de ansiedades. Vemos isso nas suas interações, nas suas escolhas, nas suas vulnerabilidades. Maury lida com a questão com a mesma naturalidade com que trata as outras camadas do personagem, sem caricaturas, sem alardes desnecessários, mas com uma honestidade que é palpável. Isso é algo que me agrada imensamente: a representação que não precisa gritar para ser vista, que simplesmente é.

O restante do elenco, de Jean-Marc Barr ao divertido Arnaud Valois e Théo Christine, preenche esse universo com cores vibrantes, cada um à sua maneira contribuindo para a jornada de Jérémie. São encontros que oferecem novos ângulos, novos espelhos para o protagonista se enxergar – ou se perder.

“Garoto Chiffon” não é um filme que te dá respostas prontas. Pelo contrário, ele te lança de volta no turbilhão de perguntas que a vida insiste em fazer. Quem somos quando voltamos para o ninho? É possível crescer sem romper com o passado? O amor de mãe, por mais sufocante que seja, ainda é amor? Em 2020, quando foi lançado originalmente, Maury já nos dava um vislumbre de uma verdade universal: a busca incessante por um lugar no mundo, e a dança eterna entre a necessidade de independência e a eterna atração do lar. É uma obra que, com sua mistura única de delicadeza e aflição, nos lembra que, às vezes, para encontrar a leveza de um chiffon, é preciso primeiro passar pela turbulência de um garoto – ou de um adulto – em crise. E isso, meu caro leitor, tá longe de ser uma história genérica. É a vida, pura e simples, com todas as suas camadas.

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