O ar gélido de outubro sempre me transporta para um lugar familiar: o universo visceral e perturbador de Jogos Mortais. E, se você me perguntar por que, em pleno 2025, eu ainda insisto em revisitar esses becos escuros da psique humana, a resposta é simples e complexa ao mesmo tempo. Não é apenas o masoquismo de assistir a armadilhas grotescas, mas a incessante curiosidade sobre a moralidade retorcida que a franquia desenterra. Hoje, meu foco repousa sobre um capítulo que, para mim, representa um ponto de virada crucial: Jogos Mortais IV, lançado lá em 2007.
Você se lembra daquele frenesi? A cada Halloween, um novo pedaço do quebra-cabeça de Jigsaw era jogado em nossas telas, e a gente ia, compelido por uma mistura de repulsa e fascínio. Jogos Mortais IV chegou com um peso extra: o vilão principal, John Kramer, o Jigsaw original, tinha morrido no filme anterior. Como, então, continuar a charada? Ah, meu amigo, é aqui que a genialidade, ou a audácia, dos roteiristas Marcus Dunstan e Patrick Melton, sob a direção de Darren Lynn Bousman, se manifesta. Eles nos provam que a morte física de um serial killer não significa o fim de sua ideologia, muito menos de seus jogos mentais sádicos.
A premissa é aquela que nos fisga de imediato: o Sargento Rigg, interpretado com uma mistura palpável de frustração e obsessão por Lyriq Bent, tem apenas noventa minutos para salvar seu amigo, o Comandante Eric Matthews. Sim, aquele mesmo Eric Matthews que vimos definhar nas edições anteriores. Mas não é tão simples, é claro. Rigg é um policial que vive para “salvar a todos”, uma falha de caráter que Jigsaw habilmente explora. A cada porta que ele arromba, a cada regra que ele quebra na sua corrida contra o tempo, ele se aprofunda mais na teia do mind game de Jigsaw. A urgência é visceral, quase palpável, e a cada relógio digital piscando na tela, você sente o aperto no peito, a tensão de um verdadeiro death game. É uma experiência de survival horror que te prende, te chacoalha e te obriga a testemunhar o preço da obsessão.
E vamos falar sobre os pilares dessa construção. Tobin Bell, mesmo já não estando “vivo” no filme em tempo presente, é uma presença fantasmagórica e inesquecível. Suas aparições em flashbacks são cruciais, aprofundando a complexa mitologia de Jigsaw e revelando novas camadas de seu passado, incluindo a tragédia do aborto espontâneo de sua esposa, Jill Tuck (Betsy Russell), que serve como um dos gatilhos para sua transformação em um psicopata moralista. Bell empresta a Jigsaw uma calma perturbadora, uma convicção que, por mais deturpada que seja, quase nos faz questionar os limites da justiça e da punição. Ele não tortura por puro sadismo; ele tortura para “ensinar”, para fazer suas vítimas apreciarem a vida. Uma lógica doentia, eu sei, mas que mexe com o nosso imaginário.
Atributo | Detalhe |
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Diretor | Darren Lynn Bousman |
Roteiristas | Marcus Dunstan, Patrick Melton |
Produtores | Oren Koules, Mark Burg, Gregg Hoffman |
Elenco Principal | Tobin Bell, Costas Mandylor, Scott Patterson, Betsy Russell, Lyriq Bent |
Gênero | Terror, Thriller, Crime |
Ano de Lançamento | 2007 |
Produtoras | Twisted Pictures, Lionsgate |
A sacada de Jogos Mortais IV é nos apresentar mais a fundo a figura de Mark Hoffman, o Detetive Hoffman, que Costas Mandylor interpreta com uma frieza calculista. Seu olhar, muitas vezes escondido sob a sombra do boné de beisebol, insinua uma profundidade sombria que só começamos a arranhar neste capítulo. Ele é o herdeiro aparente de Jigsaw, o aprendiz que levará o legado da `torture` e `pain` adiante. E não podemos esquecer o Agente Strahm, vivido por Scott Patterson, um agente do FBI implacável e determinado a desvendar o quebra-cabeça. Ele é o nosso ponto de vista, o espectador que tenta juntar as peças de um jogo macabro, quase como nós mesmos na cadeira do cinema.
A produção de Oren Koules, Mark Burg e Gregg Hoffman, através da Twisted Pictures e Lionsgate, conseguiu manter a identidade visual e sonora da franquia. É aquele tom monocromático, os flashs rápidos e a trilha sonora industrial que se tornaram sinônimos de `death match`. A cada armadilha, a cada cena de `victim` gritando, a gente se pergunta: “Será que eu aguentaria?” E a resposta é sempre um “provavelmente não” sussurrado. É a constante ameaça, o medo da `electric chair` metafórica que nos prende.
Revisitando Jogos Mortais IV em 2025, dezoito anos depois de sua estreia brasileira, é fascinante perceber como ele solidifica a complexidade da saga. Não é um filme que se limita a nos listar fatos; ele nos força a sentir, a questionar, a entrar na mente dos personagens e, por vezes, a nos confrontar com nossas próprias ideias sobre retribuição e moralidade. É um filme de `crime` e `thriller` embrulhado em um pacote de `terror` que, para o bem ou para o mal, marcou uma era no cinema. E talvez seja por isso que, por mais perturbador que seja, eu sempre voltarei para mais um jogo de Jigsaw. Não pela `female corpse` gratuita, mas pela psicologia sombria que ele tão habilmente desvela. E você, tá pronto para jogar de novo?