Deixados para Trás: O Ínicio do Fim

Quando o nome ‘Left Behind’ ressurge na conversa, quase três anos após a estreia de ‘Deixados para Trás: O Início do Fim’ nos cinemas brasileiros, confesso que uma espécie de arrepio percorre a espinha. Não é um arrepio de terror puro, mas de uma familiaridade incômoda, um reconhecimento de que, para muitos de nós, essa saga religiosa não é apenas um filme; é um fenômeno cultural com raízes profundas na fé de alguns e na curiosidade mórbida de outros. Eu, por exemplo, me lembro de ouvir sussurros sobre o Arrebatamento desde criança, de folhear livretos com ilustrações vívidas de um mundo pós-desaparecimento. Por isso, revisitar essa premissa, agora sob a batuta de Kevin Sorbo – um rosto tão emblemático de um certo tipo de cinema –, é uma jornada que, querendo ou não, carrega um peso além da tela.

O filme nos joga num caldeirão já fervilhante de ansiedade: milhões de pessoas evaporaram sem aviso, e o mundo, como o conhecíamos, desmoronou em um caos que ressoa com nossos próprios medos contemporâneos. A sinopse é direta: há quem aponte o dedo para o governo, quem erga a Bíblia como única bússola. E no meio desse redemoinho, encontramos Buck Williams, um jornalista que decide ir “até o fim” – uma frase que soa com a urgência de quem respira o cheiro de desespero no ar.

O desafio de ‘Deixados para Trás: O Início do Fim’, e talvez a sua maior ambição, é transformar um conceito teológico tão específico quanto o Arrebatamento em um thriller de ficção científica e ação que seja, de alguma forma, acessível. E aqui, a presença de Kevin Sorbo é um ponto de inflexão. Não apenas ele encarna Rayford Steele, o piloto que testemunha a ausência, mas também assume a cadeira do diretor. É uma dualidade interessante, quase um manifesto de quem acredita tanto na mensagem que a molda com as próprias mãos. Rayford, interpretado por Sorbo, não é um herói de ação tradicional; ele é um homem comum, um pai, um marido, que de repente se vê no epicentro de um mistério que desafia toda a lógica terrena. Sorbo infunde em Rayford uma vulnerabilidade crua, um misto de ceticismo e busca por redenção que o torna um ponto de entrada para o espectador – especialmente para quem não está familiarizado com os nuances da escatologia cristã.

Ainda que o filme se apoie fortemente na sua base religiosa, ele tenta costurar essa narrativa com elementos de um thriller conspiratório. Neal McDonough, como Jonathan Stonogal, e Corbin Bernsen, como Steve Plank, trazem uma gravidade, uma aura de poder e segredos que sugere que algo muito maior está em jogo do que simplesmente fé cega. Eles representam as engrenagens de um mundo que tenta se reerguer, ou talvez, se aproveitar do vácuo deixado. E então, há Bailey Chase, que dá vida a Nicolae Carpathia, o personagem central que, para quem conhece a mitologia da franquia, é a figura que emerge para preencher o vácuo de poder e esperança. A forma como Chase constrói Carpathia é sutilmente perturbadora, um carisma que se disfarça de salvador, mas que guarda uma escuridão latente.

AtributoDetalhe
DiretorKevin Sorbo
RoteiristasPaul Lalonde, Jessica Parker, John Patus
ProdutoresJohn Duffy, Michael Walker, James Quattrochi, Paul Lalonde, Jason Wan Lim
Elenco PrincipalKevin Sorbo, Neal McDonough, Corbin Bernsen, Bailey Chase, Sarah Fisher
GêneroFicção científica, Ação, Thriller, Fantasia
Ano de Lançamento2023
ProdutorasStonagal Pictures, 101 Films International, Amcomri Entertainment, Cloud Ten Pictures, Polyscope Productions

A direção de Kevin Sorbo, ao navegar por esses elementos, busca um equilíbrio delicado. Há momentos em que a tensão é palpável, com cenas que capturam o pânico pós-desaparecimento – aeroportos vazios, carros abandonados nas estradas, o silêncio pesado onde antes havia buzinas e conversas. É nessas sequências que o filme se permite respirar como um verdadeiro thriller, mostrando, e não apenas contando, o desespero. Mas há também uma inegável didática em seu coração, uma ânsia de explicar a “verdade” por trás dos acontecimentos, o que por vezes freia o ritmo de ação. Os roteiristas Paul Lalonde, Jessica Parker e John Patus parecem conscientes de que estão adaptando uma história com um público já estabelecido, o que por vezes resulta em um dilema: entre a urgência narrativa e a fidelidade à mensagem.

O que ‘Deixados para Trás: O Início do Fim’ nos oferece, em sua essência, é um olhar para o medo da incerteza e a busca por um propósito quando tudo o que se conhece desmorona. A pergunta “o que você faria se milhões simplesmente sumissem?” é um convite à reflexão, independentemente da sua crença. O filme, como as adaptações anteriores e os livros que o inspiraram, se posiciona firmemente na perspectiva da “profecia bíblica” como a única resposta. E, talvez, seja esse o ponto que polariza tanto sua audiência. Para quem busca uma confirmação de sua fé, ele serve como um poderoso reforço. Para quem vê com olhos mais céticos, ele pode ser percebido como propaganda, ainda que empacotada em roupagem de ficção científica.

Desde seu lançamento em 2023, o filme talvez não tenha reverberado tão amplamente quanto suas encarnações anteriores, mas ele permanece como um testemunho da persistência de certas narrativas culturais e religiosas no cinema. Ele nos lembra que o cinema, em todas as suas formas – seja como entretenimento puro, seja como veículo para uma mensagem específica – é um espelho das nossas esperanças e temores mais profundos. E, nesse sentido, ‘Deixados para Trás: O Início do Fim’ é um capítulo a mais na longa e complexa história da fé na tela grande, nos convidando a ponderar: o que restaria de nós se, de repente, o mundo que conhecemos desaparecesse sem um adeus? É uma pergunta que, para alguns, já tem uma resposta; para outros, segue sendo uma busca.

Trailer

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