Linhas Opostas: O Preço do Pódio e a Busca por Ar Fora da Água
É sempre fascinante revisitar filmes que, de alguma forma, tocam em feridas universais – a pressão do sucesso, o peso das expectativas familiares e a difícil jornada de encontrar nossa própria voz em meio a tanto barulho. Linhas Opostas, lançado em 2021, há quatro anos, é precisamente um desses filmes. Quando ele chegou às plataformas digitais, lembro-me de ter sido fisgado pela premissa: um drama esportivo que prometia ir além das piscinas, mergulhando nas turbulentas águas da psique adolescente. E, em grande parte, cumpriu.
O longa-metragem, dirigido e roteirizado por Tyson Wade Johnston, se inspira na trajetória de um ícone da natação australiana, Ian Thorpe, para contar a história ficcional de Benjamin ‘Boy’ Lane (Levi Miller). Benjamin, aos 15 anos, é um prodígio, um tubarão em miniatura prestes a engolir o mundo da natação. As Olimpíadas não são um sonho distante, mas uma meta tangível, quase inevitável. Sua vida, meticulosamente moldada por seu implacável treinador, Rob Bush (Jason Isaacs), e sua dedicada, mas igualmente exigente, mãe Kim (Laura Gordon), é uma sinfonia de treinos exaustivos, dietas controladas e a solidão inerente a uma disciplina de elite. Benjamin vive e respira a piscina, mas sua vida fora dela é um vácuo, um eco das braçadas que o levam à glória.
O ponto de inflexão surge com a libertação de seu pai, Dave Bush (Jake Ryan), da prisão. Um homem com quem Benjamin mal teve contato, uma figura distante que representa um mundo de liberdade, de escolhas que nada têm a ver com o cloro ou o cronômetro. É nesse choque de mundos que Linhas Opostas encontra seu coração pulsante. Benjamin se vê em uma encruzilhada brutal: seguir o caminho pavimentado para o pódio olímpico, ou arriscar tudo por uma vida que ele mal conhece, mas que promete a rara chance de ser apenas… Benjamin.
Atributo | Detalhe |
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Diretor | Tyson Wade Johnston |
Roteirista | Tyson Wade Johnston |
Produtores | Nathan Walker, Blake Northfield, Jay Douglas |
Elenco Principal | Jason Isaacs, Levi Miller, Laura Gordon, Jake Ryan, Hunter Page-Lochard |
Gênero | Drama |
Ano de Lançamento | 2021 |
Produtoras | Bronte Pictures, Screen Queensland, Screen Australia, Pantalon Pictures, Rebellion Studios |
O Mergulho na Direção, Roteiro e Atuações
Tyson Wade Johnston, tanto na direção quanto no roteiro, demonstra uma sensibilidade notável para o subtexto e os silêncios. A atmosfera é densa, quase sufocante, especialmente nas cenas da piscina, que são filmadas com uma intensidade quase documental. O close-up no rosto de Benjamin, exausto e determinado, as bolhas que sobem do fundo da piscina como metáforas para pensamentos não ditos, a frieza azul da água que é ao mesmo tempo santuário e prisão – tudo contribui para a imersão na jornada do protagonista. O roteiro, por sua vez, navega com habilidade pela complexidade das relações familiares, especialmente a dinâmica tóxica entre Benjamin, sua mãe e seu treinador, e a inserção do pai como um elemento disruptivo e catalisador.
As atuações são, sem dúvida, o grande trunfo de Linhas Opostas. Levi Miller entrega uma performance cativante como Benjamin. Ele não apenas convence como o atleta talentoso, mas também carrega com maestria o fardo emocional de um adolescente à beira de um precipício existencial. Sua linguagem corporal, a vulnerabilidade em seus olhos, a fúria contida – tudo se traduz em um retrato autêntico da pressão de ser um “high school swimmer” com o mundo observando.
Jason Isaacs, no papel do treinador Rob Bush, é um verdadeiro monstro sagrado. Seu Rob não é um vilão caricato, mas um homem movido por uma obsessão quase religiosa pela vitória, misturando dedicação, crueldade velada e uma paternidade substituta distorcida. Ele é a antítese do pai biológico de Benjamin, e Isaacs o interpreta com uma frieza calculada que gela a espinha. Laura Gordon, como Kim Lane, a mãe, também é excelente. Ela encarna a mãe que ama, mas que projeta seus próprios sonhos não realizados no filho, transformando-o num projeto. Sua performance é cheia de nuances, mostrando o conflito interno entre proteger o filho e empurrá-lo para a grandeza. Jake Ryan, como Dave, completa o trio parental, entregando um personagem complexo que, apesar de seus erros, oferece uma perspectiva tentadora de liberdade e normalidade.
Os Pontos Fortes e Fracos de Uma Corrente Contrária
Entre os pontos fortes, a profundidade psicológica dos personagens se destaca. Não há mocinhos ou vilões absolutos, apenas pessoas falhas lidando com suas ambições e inseguranças. A exploração dos temas da identidade, da liberdade pessoal e do alto custo da performance de elite é feita de maneira incisiva. O filme nos faz questionar: qual é o verdadeiro pódio? Aquele que o mundo vê ou aquele que se conquista em silêncio, dentro de si? As sequências de natação são empolgantes e bem coreografadas, e a fotografia consegue transmitir a solidão e a beleza do esporte.
No entanto, devo admitir que o ritmo do filme, em alguns momentos, pode parecer um pouco arrastado. Embora a lentidão sirva para construir a atmosfera de introspecção e melancolia, algumas subtramas ou cenas poderiam ter sido condensadas para manter a tensão. Além disso, a inserção de Josh Hill (Hunter Page-Lochard), o amigo de Benjamin, apesar de importante para mostrar um vislumbre de normalidade na vida do protagonista, por vezes parece um pouco subdesenvolvida. A recepção pela crítica, em seu lançamento em 2021, foi majoritariamente positiva, com muitos elogiando as performances e a abordagem corajosa dos temas, mas alguns apontando para a familiaridade da narrativa de “drama esportivo” e a ocasional lentidão.
Os Temas que Atravessam a Superfície
Linhas Opostas é um estudo de caráter denso, que aborda a pressão para performar que tantos jovens atletas, não apenas no “high school”, mas em qualquer nível de alta competição, enfrentam. O filme grita sobre o esmagador fardo das expectativas – dos pais, dos treinadores e, principalmente, de si mesmo. Benjamin é um peixe fora d’água em sua própria vida, obrigado a ser uma máquina, quando tudo o que anseia é ser um garoto comum.
A mensagem central gira em torno da definição de sucesso. É o ouro olímpico que valida uma vida, ou é a capacidade de fazer escolhas autênticas, mesmo que elas venham com a perda de algo grandioso? O filme desafia a noção de que a glória esportiva é a única medida de uma vida bem vivida, e nos convida a refletir sobre o sacrifício pessoal que muitas vezes se esconde por trás dos sorrisos no pódio. É a história de um adolescente tentando desesperadamente encontrar ar, não apenas para nadar, mas para respirar sua própria vida.
Uma Conexão Pessoal e a Recomendação Final
Há algo em Benjamin Lane que me tocou profundamente. Talvez seja a memória de pressões juvenis, ou a eterna luta entre o que se espera de nós e o que realmente queremos. A cena em que Benjamin precisa decidir seu caminho é palpável, um nó na garganta que me fez recordar momentos de escolhas difíceis, onde o certo não era necessariamente o fácil ou o óbvio. O filme tem essa capacidade de nos fazer questionar nossas próprias “linhas opostas”.
Para quem eu recomendaria Linhas Opostas? Se você é fã de dramas psicológicos intensos, de histórias sobre superação não apenas física, mas emocional, ou se aprecia atuações de tirar o fôlego, este longa-metragem é uma pedida obrigatória. Não é um filme sobre natação; é um filme sobre a alma humana sob pressão, sobre as escolhas que nos definem e o verdadeiro significado de liberdade. Quatro anos após seu lançamento, Linhas Opostas continua tão relevante e impactante quanto no dia em que nadou pela primeira vez nas telas. Dê uma chance a este filme; ele vai te fazer pensar, sentir e, quem sabe, reconsiderar o que realmente vale a pena perseguir na vida.