O que nos atrai ao cinema de terror, especialmente aquele que desafia nossas expectativas mais básicas? Essa é uma pergunta que me ronda sempre que me sento para ver um novo lançamento, e raramente ela se manifesta com tanta força quanto diante de um filme da A24, ainda mais quando Alex Garland está no comando. Você sabe, aquela sensação de que não está apenas a ponto de assistir a uma história, mas de mergulhar em uma experiência, em algo que vai te cutucar de maneiras que talvez você nem esperasse. É por isso que, hoje, mesmo depois de mais de três anos desde seu lançamento original em 2022, Men: Faces do Medo ainda pulsa na minha mente e me faz querer revisitar os cantos escuros de sua narrativa.
A premissa é simples, quase bucólica: Harper (uma Jessie Buckley visceral e luminosa) busca refúgio no interior pitoresco da Inglaterra após a tragédia impensável do suicídio de seu marido, James (Paapa Essiedu). Ela aluga uma casa de campo, um chalé de pedra envolto em verde luxuriante, na esperança de que o ar puro e a quietude do campo sejam um bálsamo para sua alma dilacerada. Mas, você sabe como é, a paz nem sempre reside onde a procuramos. Às vezes, ela é apenas a superfície fina que esconde um pavor mais antigo, mais primal.
Desde o primeiro momento em que Harper pisa naquelas terras, a atmosfera já se torna pesada, quase tangível. O que começa como um estranho incômodo, uma sensação de que alguém ou algo a observa da densa floresta, escalona para um pesadelo completamente formado. O diretor Alex Garland, que também assina o roteiro, tem essa maestria em transformar o mundano no absolutamente aterrorizante. Ele não precisa de muitos jump scares para te deixar arrepiado. Em vez disso, a tensão se constrói em cada sussurro do vento entre as árvores, em cada silêncio prolongado, na imagem de uma macieira carregada de frutos que, de repente, parece um presságio ominoso.
E é aí que entra o “Men”, os “Homens” do título. Harper é confrontada por uma série de figuras masculinas, todas interpretadas por um Rory Kinnear que entrega uma performance camaleônica e profundamente perturbadora. Do gentil, porém estranho, proprietário da casa, Geoffrey, ao vigário da igreja local, passando por um adolescente petulante e até mesmo um policial, todos eles parecem diferentes manifestações de uma mesma entidade, de uma mesma opressão que a cerca e a sufoca. Isso não é uma coincidência, tá? É uma escolha deliberada que nos força a questionar: o que essas faces representam? São todos eles a personificação da dor de Harper, da sua culpa, da toxicidade masculina que ela sentiu na sua vida, ou há algo mais sinistro e sobrenatural em jogo?
Atributo | Detalhe |
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Diretor | Alex Garland |
Roteirista | Alex Garland |
Produtores | Allon Reich, Andrew Macdonald |
Elenco Principal | Jessie Buckley, Rory Kinnear, Paapa Essiedu, Gayle Rankin, Sarah Twomey, Zak Rothera-Oxley, Sonoya Mizuno |
Gênero | Terror, Thriller, Fantasia |
Ano de Lançamento | 2022 |
Produtoras | A24, DNA Films |
Garland não nos dá respostas fáceis. E essa é a beleza e, para alguns, a frustração de “Men”. Como bem pontuou Chris Sawin em sua crítica, “As pessoas vão odiar _Men_ se o assistirem querendo uma história direta ou um filme que tenha um significado único e claro”. E ele está certíssimo. O filme não te entrega um manual de instruções. Pelo contrário, ele te joga num mar de simbolismos – a igreja, a maçã, o corpo mutilado – e te convida a nadar, a encontrar seu próprio caminho. É uma experiência onírica, uma fantasia de terror onde o luto, a culpa e o medo da intrusão se entrelaçam em uma tapeçaria grotesca de body horror e angústia psicológica. Você sente a dor de Harper, o tremor em suas mãos, a respiração presa em sua garganta, mesmo quando ela tenta ser forte.
Jessie Buckley, como Harper, é a âncora dessa tempestade emocional. Ela carrega o filme com uma vulnerabilidade e uma resiliência que são de tirar o fôlego. Seus olhos transmitem volumes de sofrimento e confusão, e sua atuação é um lembrete vívido de como o trauma pode consumir uma pessoa, moldando sua percepção do mundo ao seu redor. Alex Garland, por sua vez, usa sua câmera para nos colocar diretamente na pele de Harper, fazendo-nos sentir a claustrofobia do luto e a ameaça iminente que espreita em cada sombra. O design de som, por exemplo, é um mestre silencioso, amplificando os ruídos naturais do campo até que se tornem ameaças sonoras.
No final das contas, Men: Faces do Medo não é um filme para ser simplesmente assistido. É um filme para ser experimentado, para ser sentido em cada fibra do seu ser. Ele te desafia, te provoca, e te deixa com mais perguntas do que respostas. Mas não é essa, afinal, a verdadeira essência de uma obra de arte marcante? Aquela que nos força a olhar para dentro de nós mesmos, para nossos próprios medos e para as faces que o medo pode assumir? É visceral, é intrigante, e é um lembrete contundente de que, às vezes, o maior terror não vem de monstros escondidos, mas dos fantasmas que habitam nossa própria mente. E talvez, dos que vestem pele humana.