Morte, Morte, Morte

Três anos se passaram desde que Morte, Morte, Morte (ou, no original, “Bodies, Bodies, Bodies”) fez sua estreia nas telas brasileiras, e ainda me pego pensando naqueles jovens abastados, presos numa mansão, com a internet caindo e a paranoia subindo como um furacão. Sabe quando um filme gruda na sua cabeça não pela complexidade da trama, mas pela forma como ele disseca algo tão visceral e, ao mesmo tempo, tão patético? É exatamente essa a sensação que tenho com esta joia da A24. Eu, que já vi de tudo um pouco no terror, raramente me vejo tão fisgado por uma sátira que consegue ser hilária e perturbadora na mesma medida.

Por que revisitar um filme de 2022 agora, em 2025? Porque certas obras envelhecem como vinho, e outras, como esta, revelam camadas ainda mais profundas à medida que a gente se distancia da euforia do lançamento e vê como as tendências culturais que ele satiriza continuam – ou se transformaram. No fundo, meu interesse é sempre entender a condição humana, e Morte, Morte, Morte oferece um laboratório social, um microcosmo da Geração Z, que é ao mesmo tempo específico e universal em suas fragilidades.

A premissa é um prato cheio para quem aprecia um bom “whodunit” com pitadas de humor ácido. Um grupo de amigos, digamos, “nem tão amigos assim”, decide se isolar numa mansão remota para uma festança regada a álcool e jogos. Lá fora, uma tempestade se anuncia. Lá dentro, as tempestades internas já estão a mil. A brincadeira de “morte, morte, morte” — um jogo de mistério onde um dos participantes é secretamente o “assassino” — vira realidade quando um corpo de verdade aparece. E é aí que o filme, dirigido com maestria por Halina Reijn e roteirizado por Sarah DeLappe e Kristen Roupenian, desabrocha em toda a sua glória caótica.

O que me prendeu desde o primeiro minuto foi a atmosfera. Não é só a chuva torrencial lá fora, o blecaute que mergulha tudo em uma escuridão claustrofóbica e a tensão palpável entre os personagens. É a forma como o filme mostra a ansiedade e a hipocrisia desses jovens. As mãos tremem não por medo de um assassino mascarado, mas pela possibilidade de um tweet errado ou de ter sido pego numa mentira. A paranoia não vem de um monstro, mas da traição iminente, dos amigos falsos que se revelam a cada grito histérico e cada acusação esganiçada. A mansão, que deveria ser um refúgio de luxo, vira uma jaula, onde as inseguranças e os rancores se chocam como faíscas elétricas.

AtributoDetalhe
DiretoraHalina Reijn
RoteiristasSarah DeLappe, Kristen Roupenian
ProdutoresAli Herting, David Hinojosa
Elenco PrincipalAmandla Stenberg, Мария Бакалова, Myha'la, Rachel Sennott, Chase Sui Wonders, Pete Davidson, Lee Pace, Conner O'Malley
GêneroTerror, Comédia, Mistério
Ano de Lançamento2022
ProdutorasA24, 2AM

E o elenco, ah, o elenco! Rachel Sennott como Alice é um show à parte, uma atuação que Robbie Grawey, em sua crítica, já apontava como “incrível”. Ela é a epítome da “influencer” vazia, obcecada por sua imagem e por ser “legal”, mesmo quando o caos se instala ao seu redor. Sua personagem é hilária na sua falta de noção e na sua constante busca por validação, um espelho farcical de certas facetas da Geração Z. Amandla Stenberg como Sophie e María Бакалова como Bee formam um casal com uma dinâmica fascinante; Bee, a forasteira, nos serve como uma espécie de guia neste circo de horrores sociais. As tensões de um triângulo amoroso e a infidelidade que permeiam o grupo são sentidas através das suas interações, revelando feridas profundas. Até mesmo Pete Davidson, no papel de David, o ex-namorado irritante, consegue trazer uma energia caótica que serve perfeitamente ao tom do filme. Lee Pace, como Greg, é a cereja do bolo, um contraponto geracional que adiciona outra camada de absurdo.

A genialidade de Morte, Morte, Morte reside em sua capacidade de misturar gêneros com tamanha fluidez. É um terror, sim, com momentos genuinamente chocantes e um senso de perigo que cresce. Mas é, antes de tudo, uma comédia de humor negro e um mistério afiado. O roteiro é espirituoso e sarcástico, cheio de diálogos que são tão específicos da linguagem da Geração Z que chegam a ser um idioma próprio, mas que carregam uma verdade universal sobre a comunicação (ou a falta dela) e as inseguranças na era digital. É uma sátira mordaz sobre privilégio e a forma como a tecnologia molda nossas relações. Cada morte, seja ela acidental ou intencional, funciona como um catalisador para mais revelações sobre a superficialidade e a toxicidade dessas amizades.

Eu entendo perfeitamente o que Nathan quis dizer em sua crítica ao afirmar que o filme “não funcionou tão bem” para ele. Morte, Morte, Morte não é para todos. Seu humor é seco, seu retrato da juventude rica é impiedoso e o ritmo, por vezes, pode parecer um pouco arrastado para quem busca apenas um slasher tradicional. Mas para mim, que busco um cinema que me faça rir enquanto me força a pensar, que me jogue para dentro de uma experiência sensorial e me faça questionar a natureza humana, este filme é um triunfo. A direção de Halina Reijn é impecável, construindo uma narrativa que se desenrola de forma orgânica, sem nunca se prender a estruturas previsíveis. A fotografia é imersiva, usando a iluminação intermitente e os cenários luxuosos e claustrofóbicos para amplificar a sensação de pânico e desorientação.

No final das contas, Morte, Morte, Morte é um filme que me provocou a rir alto e a encolher na cadeira, às vezes no mesmo minuto. É um “filme de festa” que funciona como uma parábola sombria, um alerta sobre o quão frágil é a nossa bolha de “amigos” e “likes” quando a realidade bate à porta – ou, nesse caso, quando o poder falha e um corpo surge na piscina. É uma cápsula do tempo, um artefato cultural que, mesmo em 2025, continua a ressoar com a verdade sobre a ansiedade de uma geração, embalada em uma trama de mistério que é ao mesmo tempo brincalhona e, francamente, um pouco assustadora. É um filme que, para mim, vale cada segundo do revisitar.

Trailer

Ofertas Imperdíveis na Shopee

Que tal uma pausa? Confira as melhores ofertas do dia na Shopee!

Aproveite cupons de desconto e frete grátis* em milhares de produtos. (*Consulte as condições no site).

Ver Ofertas na Shopee