Sabe, todo ano, quando as luzes de Natal começam a piscar e as músicas festivas invadem os shoppings, a gente se prepara para aquela dose de filmes aconchegantes. Aqueles que nos lembram da magia, da família, da esperança. Mas aí, em 2022, Jordan VanDina decidiu virar essa tradição de ponta-cabeça com Mucho Locos no Natal, e, para ser sincero, eu ainda estou processando a audácia, e o brilho, dessa virada.
Minha motivação para revisitá-lo hoje, em outubro de 2025, é justamente essa memória que o filme deixou: a de ser um ponto fora da curva, um grito descontrolado em meio ao coro angelical. Você, assim como eu, provavelmente se perguntou: “O que cargas d’água é isso?” O filme nos transporta para um futuro próximo, onde álcool e drogas são banidos… exceto por um glorioso dia do ano. E, por uma daquelas ironias cósmicas que só o cinema permite, esse dia de anarquia total milagrosamente cai no Natal. Imagine só: Papai Noel trocando seu trenó por uma moto aquática movida a tequila, e os duendes, bem, os duendes certamente estariam vivendo sua própria versão de “Las Vegas em Bagdá”.
É uma premissa que, de cara, soa como um desafio: como transformar um conceito tão subversivo – a liberação total das inibições em um dos dias mais sacros do calendário ocidental – em algo que funcione como comédia? VanDina, que assina tanto a direção quanto o roteiro, não se esquiva da complexidade inerente a essa ideia. Ele não busca uma moral da história fácil ou um final redentor no estilo “espírito natalino”. Longe disso. Ele mergulha de cabeça no caos, nos convidando a rir do absurdo, da nossa própria rigidez e da hipocrisia de qualquer sociedade que tente controlar demais.
E é nesse mergulho que a gente encontra Andrew (Eduardo Franco), Hags (Dexter Darden) e Sarah (Zainne Saleh). Esse trio é o nosso guia por essa paisagem natalina distorcida, onde o cheiro de pinho se mistura com o de alguma fumaça suspeita. Eduardo Franco, com aquela sua entrega que já conhecemos de outras produções, dá a Andrew uma espécie de otimismo ingênuo, mesmo quando ele está prestes a fazer as maiores loucuras. É ele quem, muitas vezes, nos ancora, nos fazendo pensar: “Será que esse cara vai realmente fazer isso?”. Hags, interpretado por Dexter Darden, é a energia pura, a faísca que acende o pavio da bagunça. Se Andrew hesita, Hags já está pulando de um telhado com uma fantasia de rena. E Zainne Saleh, como Sarah, traz uma camada de racionalidade – ou pelo menos uma tentativa dela – a essa equação. Ela é a voz que talvez a gente mesmo estaria ouvindo dentro da cabeça: “Isso não vai dar certo, gente!”. Mas o encanto da comédia é justamente vê-los ignorar essa voz.
| Atributo | Detalhe |
|---|---|
| Diretor | Jordan VanDina |
| Roteirista | Jordan VanDina |
| Elenco Principal | Eduardo Franco, Dexter Darden, Zainne Saleh, Kaitlin Olson, Marta Piekarz |
| Gênero | Comédia |
| Ano de Lançamento | 2022 |
| Produtoras | American High, LD Entertainment |
E não podemos falar do elenco sem mencionar a genialidade de Kaitlin Olson como a prefeita Spengler. Ela tem um timing cômico afiado, uma capacidade de transformar a autoridade em algo hilariamente patético. Vê-la navegar por esse dia, tentando manter uma fachada de controle enquanto tudo desmorona ao seu redor, é um espetáculo à parte. Marta Piekarz, como Kimmi, também entrega momentos memoráveis, contribuindo para a tapeçaria de personagens excêntricos que habitam essa realidade insana. O elenco todo trabalha em sintonia, transformando o que poderia ser uma simples sucessão de piadas em algo com um ritmo quase musical, um pandemônio orquestrado.
Mucho Locos no Natal não tem medo de ser barulhento, de ser visualmente caótico. As produtoras American High e LD Entertainment, conhecidas por seu trabalho em comédias voltadas para o público jovem, parecem ter dado a VanDina a liberdade para extravasar. O filme é uma explosão de cores e de cenários de Natal que foram profanados da forma mais hilária possível. É como se alguém tivesse jogado uma bomba de purpurina e LSD numa festa de família. E, no meio de tudo isso, surge uma questão sutil: o que acontece quando as regras são suspensas? Será que a verdadeira “liberdade” é isso, ou apenas um convite para o descontrole? O filme não te dá respostas fáceis, e é essa ambiguidade que o torna mais interessante do que uma simples comédia de “abuso de drogas e álcool” no Natal.
Não, ele não é o tipo de filme que você assiste com a vovó na noite de Natal, a menos que sua vovó seja do tipo que já passou por poucas e boas e tenha um senso de humor… peculiar. É um filme para quem está cansado do óbvio, para quem busca uma risada que vem do choque, do inusitado. É uma celebração do que acontece quando a gente tira o pé do freio e decide apenas existir por um dia, sem amarras.
Ao final da sessão, a gente não sai pensando no “espírito natalino” tradicional, mas sim naquele Natal específico de 2022, onde o impossível aconteceu. E, honestamente, às vezes, é disso que a gente precisa: um lembrete de que o cinema pode ser essa válvula de escape, esse lugar onde as regras são reescritas e onde o caos pode ser, ironicamente, a coisa mais divertida do mundo. Mucho Locos no Natal é isso: um brinde à subversão, embrulhado em papel de presente. E se isso não é um presente para o nosso eu caótico interior, eu não sei o que é.




