Ah, a sedução do desconhecido… Quantas vezes nos pegamos hipnotizados por filmes que prometem uma fuga, apenas para nos arrastar para um pesadelo que não sabíamos que procurávamos? É um tipo peculiar de masoquismo cinematográfico, não é? E é exatamente essa corda bamba entre o desejo e o terror que me trouxe a Nas Profundezas, um thriller que, apesar de ter chegado às telas gringas lá em 2022, ainda aguarda sua chance de mergulhar em solo brasileiro. Já estamos em setembro de 2025 e o burburinho sobre essa joia (ou seria armadilha?) ainda ecoa, me fazendo pensar: por que cargas d’água ainda não vimos isso por aqui?
Sabe, a gente passa a vida buscando algo que nos tire do lugar comum. Um novo amor, uma viagem, uma chance de recomeçar. E é nessa vulnerabilidade que a história de Jess (Ella-Rae Smith) se encaixa como uma luva apertada. Ela está desesperada por uma fuga, a vida pesando nos ombros como uma âncora invisível. É nesse ponto que o mistério se manifesta, na figura de Ben (Matthew Daddario), um estranho atraente, envolto em uma aura de promessas e perigo. Ele acende a faísca da aventura, da viagem romântica que ela tanto anseia. Quem de nós nunca sonhou em ser resgatado da rotina por um par de olhos magnéticos e um convite irrecusável? Mas, como bem sabemos, nem tudo que reluz é ouro, e no caso de Ben, talvez seja apenas o reflexo de um abismo.
O que se desenrola em Nas Profundezas é um balé tenso entre o engano e a descoberta brutal. Kate Cox, na direção, parece entender a linguagem da claustrofobia e do isolamento, mesmo quando os personagens estão cercados pela imensidão do oceano. Jess e Ben, em seu luxuoso barco, ladeado por um jet ski que, de símbolo de liberdade, se torna um instrumento de pavor, flutuam em uma espécie de limbo. O roteiro de David Beton não nos dá respiro, amarrando a narrativa em uma espiral descendente onde a confiança se esvai a cada cena. A cada sorriso de Ben, você sente um arrepio. A cada piscada de Jess, você anseia que ela perceba a profundidade do buraco em que se meteu.
Ella-Rae Smith entrega uma performance visceral. Suas mãos tremem levemente ao pegar uma taça, seus olhos, antes cheios de esperança, gradualmente se tornam janelas para o terror. Não é apenas o medo gritado; é o pavor que se instala no fundo do estômago, o choque da traição gravado em cada microexpressão. Matthew Daddario, por sua vez, é a personificação da dualidade. Ele exala um charme sedutor que nos faz entender por que Jess cairia em sua armadilha, mas por baixo dessa fachada polida, o perigo espreita, frio e calculista. É a habilidade de nos fazer torcer e temer por ele ao mesmo tempo que o torna tão eficaz.
Atributo | Detalhe |
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Diretora | Kate Cox |
Roteiristas | David Beton |
Produtores | Marc Goldberg, Leonora Darby, Mark Lane, Sarah Gabriel, James Harris |
Elenco Principal | Ella-Rae Smith, Jessica Alexander, Matthew Daddario, Nikkita Chadha, Jack Morris, Andrew Steele, Michael Workeye |
Gênero | Thriller |
Ano de Lançamento | 2022 |
Produtoras | Tea Shop & Film Company, Signature Films, Capstone Studios |
E não posso esquecer de Lexie (Jessica Alexander), a misteriosa mulher que entra em cena para virar o jogo de cabeça para baixo. Ela não é apenas um plot twist; ela é uma força da natureza, uma peça fundamental que eleva a aposta e distorce ainda mais a já frágil realidade de Jess. A dinâmica entre essas duas mulheres, em meio ao caos orquestrado, é um estudo fascinante sobre sobrevivência e a busca por aliados onde menos se espera. A presença de uma velha polaroid, um artefato quase anacrônico nos dias de hoje, serve como um lembrete tangível de memórias distorcidas e segredos macabros, um registro físico da verdade que insiste em vir à tona.
O filme também parece tocar em feridas mais profundas, sugerindo nuances sobre relacionamentos familiares, talvez uma complexa relação entre pai e filha que assombra Jess, ou que é de alguma forma explorada pelos seus captores. É essa camada não explicitada que nos faz questionar as motivações subjacentes, as fragilidades que nos tornam presas fáceis. A produção, cortesia de casas como Tea Shop & Film Company, Signature Films e Capstone Studios, entregou um visual impecável que, paradoxalmente, realça a sujeira moral da história. A beleza cênica do mar aberto contrasta brutalmente com a feiura da violência humana, um espelho distorcido que reflete o perigo sob a superfície calma.
Nas Profundezas não é apenas um filme de sustos baratos. É um thriller psicológico que nos prende pela garganta, explorando o quão tênue é a linha entre a esperança e o desespero, entre a sedução e a armadilha mortal. Ele nos força a encarar a escuridão que pode se esconder por trás de um sorriso bonito e a solidão que empurra as pessoas para escolhas arriscadas. E é por tudo isso que me pergunto, com uma pontinha de irritação e muita expectativa: até quando nós, espectadores brasileiros, teremos que esperar para mergulhar nesse lago de engano e adrenalina? Se você tem a chance de encontrá-lo, não hesite. Mas prepare-se, porque o mergulho será gelado e perturbador.