Woody Allen e a Magia Desbotada de Simplesmente Alice: Uma Resenha
Trinta e cinco anos se passaram desde que Simplesmente Alice (1990) chegou aos cinemas, e sua magia, infelizmente, não resistiu ao teste do tempo com a mesma graça que a performance impecável de Mia Farrow. Lançado no Brasil em 14 de julho de 2010, o filme permanece um estudo de caso fascinante sobre o mestre do cinismo neoyorquino em um momento peculiar de sua carreira, um período em que o romantismo e o fantástico se misturavam a sua já característica ironia. O filme acompanha Alice Tate, uma dona de casa aparentemente satisfeita em seu casamento de dezesseis anos, até que o encontro com um charmoso saxofonista a desperta para uma vida além da rotina suburbana. Uma dor nas costas a leva a um herbalista oriental, cujos remédios lhe concedem poderes inusitados e a lançam em uma jornada de autodescoberta, permeada por comédia, drama e um toque de fantasia.
A Direção, o Roteiro e as Performances: Um Trio Complexo
A direção de Woody Allen, como sempre, é impecável em sua construção de cenas e diálogos afiados, mas em Simplesmente Alice há um tom diferente. A câmera acompanha a transformação de Alice com uma certa ternura que não é usual em seu trabalho, equilibrando a acidez de suas observações sobre a vida conjugal com um olhar quase lírico para as situações fantasiosas. O roteiro, também de Allen, é onde o filme mais se divide: há momentos de pura genialidade, com diálogos hilários e observações perspicazes sobre relacionamentos e a natureza humana, mas outros se perdem em uma fantasia um tanto gratuita, que não chega a se sustentar dramaticamente.
O elenco é estelar. Mia Farrow entrega uma atuação impecável, capaz de transmitir a vulnerabilidade e a força interior de Alice com notável sutileza. William Hurt, como o marido enganado, e Joe Mantegna, como o sedutor saxofonista, oferecem performances sólidas, porém em um segundo plano diante do brilho de Farrow. Alec Baldwin e Blythe Danner compõem um elenco de apoio eficiente, dando corpo ao universo familiar de Alice.
Atributo | Detalhe |
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Diretor | Woody Allen |
Roteirista | Woody Allen |
Produtor | Robert Greenhut |
Elenco Principal | Mia Farrow, William Hurt, Joe Mantegna, Alec Baldwin, Blythe Danner |
Gênero | Fantasia, Drama, Romance, Comédia |
Ano de Lançamento | 1990 |
Produtoras | Orion Pictures, Jack Rollins & Charles H. Joffe Productions |
Pontos Fortes e Fracos: Uma Balança Desequilibrada
A maior força de Simplesmente Alice reside na performance de Mia Farrow e na habilidade de Woody Allen em criar momentos de comédia genuinamente engraçados, mesmo em meio a situações dramáticas. A atmosfera onírica que permeia o filme, apesar de irregular, confere uma atmosfera única e envolvente em alguns momentos.
Porém, o filme peca por não explorar plenamente suas premissas. A fantasia é usada de forma episódica, sem uma construção consistente ou uma resolução satisfatória. A exploração do tema da infidelidade, tão presente na trama, também fica um pouco superficial, limitando-se a retratos estereotipados. O terceiro ato, em particular, parece apressado, deixando pontas soltas e abrindo mão de uma exploração mais profunda dos dilemas de Alice.
Temas e Mensagens: Uma Reflexão sobre a Rotina e o Desejo
Simplesmente Alice explora, de forma indireta, a busca pela realização pessoal em meio a uma rotina sufocante. A personagem de Mia Farrow representa uma mulher aprisionada em suas próprias expectativas e em uma sociedade que, na época, limitava as ambições femininas. A infidelidade, vista não como um ato de rebeldia pura e simples, mas como consequência da falta de realização pessoal, é tratada com uma nuance rara em filmes de Hollywood daquela época. O filme também aborda a complexidade das relações familiares, e a busca pela reconciliação consigo mesma, enquanto a magia age quase como um catalisador para a confrontação dos seus problemas internos.
Conclusão: Uma Obra Menor, Mas Não Sem Mérito
Simplesmente Alice, apesar de suas imperfeições, permanece um filme interessante para quem aprecia a obra de Woody Allen. Não é um de seus melhores trabalhos, mas possui momentos de brilho indiscutível. Recomendo-o para aqueles que buscam uma comédia dramática com pitadas de fantasia, cientes de que sua magia pode não ser tão duradoura quanto a memória de um romance passageiro. Se você procura algo profundo e consistente, talvez se decepcione, mas se aprecia uma abordagem mais leve e ligeiramente descompromissada, vale a pena dar uma chance a esse filme – seja em plataformas digitais ou em alguma sessão especial de cinema que, quem sabe, aconteça em algum festival. Afinal, a magia do cinema, assim como as ervas do Dr. Yang, pode nos surpreender.