Ah, a nostalgia! É impossível não sentir um certo aconchego quando o universo de Charlie Brown e sua turma se reacende na tela. Lançado originalmente em 2022 e chegando às plataformas digitais no Brasil em agosto daquele mesmo ano – ou seja, há pouco mais de três anos, para sermos precisos –, Snoopy Apresenta: A Escola da Lucy não é apenas mais um título na vasta e querida coleção dos Peanuts. É, antes de tudo, uma delicada e pungente reflexão sobre o pavor da mudança e a beleza da adaptabilidade, tudo embrulhado no charme inconfundível de Charles M. Schulz.
Este filme, que honra o legado da franquia, nos transporta para o limiar de um novo ano letivo, um período que, para muitos de nós, evoca uma mistura agridoce de ansiedade e excitação. A turminha dos Peanuts, como sempre, é o espelho perfeito das inquietações infantis – e, sejamos honestos, das adultas também. Com a perspectiva da escola nova pairando no ar, a tensão é palpável entre os jovens protagonistas. É nesse cenário que a impetuosa Lucy Van Pelt, com sua confiança desmedida e um toque de megalomania, tem uma ideia brilhante: por que não abrir sua própria escola? A premissa é clássica Peanuts: uma solução aparentemente simples que inevitavelmente se transforma em um labirinto de desafios, revelando que a arte de ensinar é, de fato, muito mais complexa do que se supunha. E, no fim das contas, Lucy e seus “alunos” acabam aprendendo que a mudança, por mais assustadora que seja, pode ser o caminho para algo bom.
O Coração Peanuts em Nova Embalagem
O que me cativa em produções como Snoopy Apresenta: A Escola da Lucy é a forma como elas conseguem manter a essência da obra original, ao mesmo tempo em que a revitalizam para uma nova geração. O diretor Raymond S. Persi, um veterano da animação com experiência em obras de peso, demonstra uma sensibilidade notável para o universo Peanuts. Sua direção não tenta reinventar a roda; em vez disso, ele opta por um estilo visual que respeita a estética clássica, com cores vibrantes e um design de personagem que é imediatamente reconhecível. A fluidez da animação da WildBrain Studios é um espetáculo à parte, mantendo o charme dos traços bidimensionais com a riqueza de detalhes que a tecnologia moderna permite. Não é uma mera cópia; é uma evolução respeitosa que mantém o calor e a expressividade que sempre definiram esses personagens.
O roteiro, assinado por Craig Schulz, Cornelius Uliano e Bryan Schulz, tem o DNA Peanuts pulsando em cada diálogo. É fascinante ver como a nova geração da família Schulz continua a tecer narrativas que parecem ter saído diretamente da mente do criador. Eles capturam a melancolia existencial de Charlie Brown, o pragmatismo ácido de Lucy e a sabedoria precoce de Linus com uma precisão impressionante. O texto é pontuado por aquele humor sutil, muitas vezes irônico, que nos faz rir e, ao mesmo tempo, refletir sobre as pequenas tragédias e vitórias do cotidiano. A forma como abordam o medo do desconhecido e a resiliência infantil é genuinamente tocante, sem cair no sentimentalismo barato. É um equilíbrio delicado que poucos conseguem atingir.
| Atributo | Detalhe |
|---|---|
| Diretor | Raymond S. Persi |
| Roteiristas | Craig Schulz, Cornelius Uliano, Bryan Schulz |
| Produtor | Timothy Jason Smith |
| Elenco Principal | Etienne Kellici, Isabella Leo, Wyatt White, Terry McGurrin, Rob Tinkler |
| Gênero | Família, Animação, Comédia |
| Ano de Lançamento | 2022 |
| Produtoras | WildBrain Studios, Charles M. Schulz Creative Associates, Peanuts Worldwide |
E o elenco de voz? É um triunfo absoluto! Etienne Kellici entrega um Charlie Brown que é a personificação da insegurança cativante, com aquela voz que evoca a simpatia imediata que sentimos pelo garoto da camiseta em zigue-zague. Isabella Leo, como Lucy, é fenomenal; ela capta a arrogância, a determinação e, surpreendentemente, a vulnerabilidade da personagem com uma nuance que me surpreendeu positivamente. Wyatt White dá vida a um Linus que transborda a calma e a filosofia que esperamos do pequeno portador de cobertor. E o que dizer de Terry McGurrin e Rob Tinkler? Dar voz a Snoopy e Woodstock, respectivamente, é um desafio único, já que se trata de uma atuação essencialmente não-verbal. Eles conseguem transmitir toda a expressividade, alegria e lealdade desses ícones através de latidos, grunhidos e gorjeios, provando que a comunicação vai muito além das palavras.
Fortalezas e Reflexões
Entre os pontos fortes do filme, a profundidade dos temas é inegável. “A Escola da Lucy” não é apenas um filme sobre crianças indo para a escola; é uma parábola sobre o medo da mudança, a importância da amizade e a complexidade de assumir novas responsabilidades. A jornada de Lucy como “professora” é um lembrete agridoce de que o controle é uma ilusão e que a paciência é uma virtude que se adquire com a prática (e muitas frustrações). A mensagem de que superar medos é um processo, e que o apoio dos amigos é fundamental, ressoa com força.
A meu ver, uma das maiores vitórias do filme é sua capacidade de ser atemporal. Ele fala tanto com as crianças que estão prestes a enfrentar seu primeiro dia de aula quanto com os adultos que, volta e meia, se veem diante de novos desafios e sentem aquele friozinho na barriga. É um lembrete gentil de que a resiliência é um superpoder e que a aventura de aprender nunca termina, seja na sala de aula ou na “escola” improvisada de Lucy.
Se há um ponto onde o filme poderia ter ousado um pouco mais, talvez fosse na exploração de novas dinâmicas entre os personagens. Embora a fidelidade seja um trunfo, em alguns momentos, a previsibilidade dos arcos narrativos clássicos pode ser um pouco limitante para quem busca algo totalmente inovador. Mas essa é uma crítica que faço com um sorriso nos lábios, pois a verdade é que esperamos e amamos a familiaridade que os Peanuts nos oferecem. Não é um “defeito”, mas sim uma característica que define o gênero e a franquia.
Para mim, os Peanuts sempre foram mais do que apenas desenhos animados; eles foram aulas de vida disfarçadas de tirinhas e especiais de TV. “A Escola da Lucy” me fez pensar na minha própria ansiedade ao começar algo novo, nos professores que me desafiaram e naqueles momentos em que a vida me jogou numa situação em que tive que aprender na marra. É a beleza de Schulz: ele nos faz rir dos nossos defeitos e, no processo, nos ajuda a aceitá-los e superá-los.
Veredito Final: Um Abraço Calmo na Incerteza
Snoopy Apresenta: A Escola da Lucy é um filme que cumpre o que promete e vai além. Não é uma obra-prima revolucionária que subverte todas as expectativas, mas é, sim, um filme profundamente satisfatório e emocionalmente ressonante. Ele se encaixa perfeitamente no catálogo “Snoopy Apresenta”, oferecendo uma experiência familiar completa, cheia de risadas, ensinamentos e aquela pitada de melancolia que torna os Peanuts tão humanos.
Se você é um fã de longa data do Snoopy, Charlie Brown e sua turma, este filme é um reencontro caloroso com velhos amigos. Se você é novo no universo Peanuts, é uma excelente porta de entrada para um mundo de personagens inesquecíveis e lições atemporais. Recomendo-o sem reservas para famílias que buscam uma animação que entretém e educa, ou para qualquer um que precise de um lembrete gentil de que enfrentar o desconhecido com coragem (e alguns amigos) é sempre a melhor estratégia. Em um mundo onde a mudança é a única constante, “A Escola da Lucy” é um pequeno farol de esperança e sabedoria. Vá em frente, dê uma chance – você não vai se arrepender.




