Já se passaram alguns anos desde que Ted Bundy: A Confissão Final (no original, “No Man of God”) estreou aqui no Brasil, em meados de 2022, mas a verdade é que certos filmes ficam na gente, remoendo, muito depois dos créditos rolarem. E, pra mim, esse é um deles. Por que continuamos tão obcecados com a figura de Ted Bundy? O que nos atrai para essas sombras do comportamento humano? É uma pergunta que eu me faço constantemente, e que este filme, estrelado por um surpreendente Elijah Wood e um assustadoramente convincente Luke Kirby, me fez revisitar com uma intensidade quase desconfortável.
Não se engane: Ted Bundy: A Confissão Final não é mais um daqueles filmes que glorificam a figura do serial killer, nem busca sensacionalismo barato. Graças a Deus, né? Nós já vimos isso. O que a diretora Amber Sealey nos oferece é algo muito mais íntimo, claustrofóbico e, no fim das contas, profundamente perturbador. É um mergulho quase cirúrgico na relação entre o agente do FBI Bill Hagmaier (Elijah Wood) e o infame Ted Bundy (Luke Kirby) em seus últimos dias no corredor da morte, na Flórida, no final dos anos 80. É a história real de como um homem tentou extrair a verdade da mente mais retorcida que já existiu, e o custo humano dessa empreitada.
Desde o primeiro momento, somos jogados para dentro daquelas salas de interrogatório na prisão. Não há grandes cenários, não há perseguições alucinantes. O terror aqui é psicológico, brotando de cada palavra, de cada olhar. Elijah Wood, que muita gente ainda associa a um certo hobbit aventureiro, entrega uma performance que me deixou arrepiado. Ele não interpreta Hagmaier como um herói destemido ou um super-agente do FBI. Pelo contrário. Ele mostra a vulnerabilidade, o cansaço, a decência humana que está sendo posta à prova. Você vê nos olhos de Wood o esforço para não ser engolido pela escuridão, a maneira como ele tenta manter sua sanidade enquanto escuta os detalhes mais macabros de crimes indizíveis. É uma atuação de contenção, de sutileza, onde o silêncio e as reações não verbais gritam mais alto do que qualquer diálogo. Ele é o nosso ponto de entrada para esse abismo, e a gente sente o peso dessa jornada junto com ele.
E então, temos Luke Kirby como Ted Bundy. Olha, eu tenho que ser sincero: quando vi o nome dele, pensei: “Será que consegue capturar a essência daquele homem?” E a resposta é um sonoro “sim”. Kirby não tenta imitar Bundy fisicamente de forma caricatural, mas ele captura a essência do manipulador, do intelectual distorcido, do lobo em pele de cordeiro. Há um charme sedutor em sua voz, uma inteligência afiada em seus olhos, que se alterna com lampejos de uma frieza gélida que te faz sentir um arrepio na espinha. Ele é articulado, arrogante, e absolutamente aterrorizante em sua falta de remorso. A química entre Wood e Kirby é palpável, quase elétrica. É um jogo de gato e rato onde as regras são constantemente reescritas pela mente sádica de Bundy, e você sente a tensão a cada batida de coração, a cada pausa no diálogo.
Atributo | Detalhe |
---|---|
Diretora | Amber Sealey |
Roteirista | C. Robert Cargill |
Produtores | Kim Sherman, Lisa Whalen, Elijah Wood |
Elenco Principal | Elijah Wood, Luke Kirby, Aleksa Palladino, Robert Patrick, W. Earl Brown |
Gênero | Crime, Drama, Thriller, História |
Ano de Lançamento | 2021 |
Produtoras | XYZ Films, Company X |
A genialidade de C. Robert Cargill no roteiro, e a direção precisa de Amber Sealey, reside justamente em nos manter nesse espaço confinado, nos forçando a confrontar a face do mal sem o filtro da ação ou de reviravoltas mirabolantes. Sealey, como uma diretora mulher, traz uma sensibilidade única para a narrativa, evitando a exploração gratuita e focando na psicologia das interações. Ela não romantiza Bundy; ela o desconstrói através de sua própria autoproclamação e das reações de Hagmaier. O filme se passa quase inteiramente em salas espartanas, e ainda assim, consegue ser mais angustiante do que muitos thrillers de ação que eu já vi. A fotografia, os close-ups nos rostos tensos, a maneira como a luz incide em cada detalhe, tudo contribui para a sensação de estar preso ali, testemunhando algo que a gente desejaria não saber.
É uma história sobre a confissão, sim, mas é também sobre a busca por um entendimento, por um “porquê” que talvez nunca possa ser respondido. Hagmaier entra nessa pensando que vai extrair informações para o FBI sobre outros casos não resolvidos. Mas será que é só isso? Ou há uma curiosidade sombria, um desejo de olhar o mal nos olhos para entender sua forma, mesmo que isso custe pedaços de sua própria alma? O filme explora essa ambiguidade sem dar respostas fáceis, o que o torna infinitamente mais potente.
Ted Bundy: A Confissão Final não é um filme para te fazer sentir bem. Longe disso. É um filme para te fazer pensar, para te incomodar, para te confrontar com a ideia de que a monstruosidade pode vestir um terno e falar com eloquência. Ele nos lembra que, por mais que tentemos entender a mente de um serial killer, há um abismo que talvez seja melhor não cruzar completamente. Mas, se você tiver coragem para espiar o que acontece à beira desse abismo, este filme oferece uma experiência cinematográfica potente e inesquecível, que ainda me persegue anos depois de tê-lo assistido. E isso, pra mim, é a marca de um grande cinema.