Tempo: Uma Ode Caótica à Vida, à Morte e ao Absurdo
João Pedro Rodrigues, cineasta que parece desafiar a própria definição de “normalidade” em cinema, nos presenteou em 2023 com Tempo, uma comédia musical que, a dois anos de distância, ainda me persegue com sua beleza inebriante e sua estranheza desconcertante. Vi o filme pela primeira vez no Festival de Cinema de Ghent e, desde então, não consigo parar de pensar nele. Não é um filme fácil, longe disso. Mas é, sem sombra de dúvidas, um filme inesquecível.
A trama, que se esquiva com maestria de qualquer resumo trivial, acompanha uma série de personagens interligados em Lisboa, numa jornada que mistura o realismo cru com sequências oníricas de uma beleza surrealista. É uma tapeçaria narrativa tecida com humor negro, momentos de profunda melancolia e explosões de energia pura, que se assemelham a um sonho febril e hipnótico. Não esperem uma narrativa linear; Tempo é uma experiência sensorial, uma imersão em um universo único e vibrante, onde a morte e a vida dançam juntas em um ritmo frenético.
A direção de Rodrigues é simplesmente magistral. Ele se utiliza da linguagem cinematográfica como uma orquestra, conduzindo-nos por um fluxo de imagens, sons e emoções que raramente se assemelha a algo que já tenhamos visto. Cada plano é meticulosamente construído, cada transição uma pequena obra-prima, criando uma atmosfera ao mesmo tempo lúdica e profundamente perturbadora. A escolha de Lisboa como cenário é crucial, com a cidade servindo como personagem coadjuvante, suas ruas sinuosas e vielas sombrias refletindo a complexidade das personagens e suas jornadas.
Atributo | Detalhe |
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Diretor | João Pedro Rodrigues |
Gênero | Comédia, Música |
Ano de Lançamento | 2023 |
Produtora | Film Fest Ghent |
As atuações, tão particulares quanto a direção, complementam a experiência. Não se trata de performances que visam à perfeição realista, mas sim a uma entrega visceral, quase ritualística. Os atores abraçam a excentricidade dos personagens, entregando-se ao fluxo onírico do filme sem hesitação. É um casting que parece ter sido selecionado para a sua capacidade de incorporar o absurdo com uma naturalidade desconcertante.
Um dos pontos fortes de Tempo reside em sua ousadia. Rodrigues não se esquiva de temas difíceis, explorando a mortalidade, a fragilidade da existência e a busca incessante por significado num mundo aparentemente sem sentido. A obra é uma ode à vida, sim, mas também uma meditação poética sobre a sua finitude. A música desempenha um papel fundamental nesse processo, funcionando como um contraponto melódico às cenas, intensificando emoções e construindo uma atmosfera única.
Por outro lado, a falta de clareza narrativa pode ser vista como um ponto fraco para alguns espectadores. Tempo não é um filme para quem busca uma história linear e facilmente digerível. A sua ambição, a sua própria natureza onírica, pode ser frustrante para quem prefere uma narrativa mais tradicional. A experiência pode, portanto, ser polarizadora.
Concluindo, Tempo é uma experiência cinematográfica que transcende as convenções e desafia as expectativas. É uma obra-prima única, um filme que exige a sua atenção, a sua entrega e a sua abertura para o inusitado. Se você busca um cinema que te faça pensar, que te faça sentir, que te faça questionar, então Tempo é imperdível. Se você preferir filmes mais tradicionais, talvez seja melhor esperar até encontrar outro lançamento que combine melhor com suas preferências. A dois anos de seu lançamento, Tempo continua sendo um filme que ecoa na minha memória, uma prova do poder transformador e duradouro de uma obra verdadeiramente original. Recomendo fortemente que se procure o filme em plataformas de streaming ou em cinemas independentes que ainda o exibem – uma experiência que você provavelmente não irá esquecer.