Quem de nós, na casa dos 30 ou 40, não se pegou cantarolando o tema de Tico e Teco: Defensores da Lei enquanto organizava a estante ou tentava resolver um mistério trivial do dia a dia? Eu, pelo menos, sim. E foi com essa bagagem de nostalgia, mas também com um certo ceticismo, que me sentei para assistir ao filme de 2022, que chegou ao Brasil em maio daquele ano, e sobre o qual ainda me pego pensando, quase três anos depois. Porque, meu amigo, Tico e Teco: Defensores da Lei, na versão cinematográfica dirigida por Akiva Schaffer, não é apenas um revival. É um manifesto.
Tá, vamos ser honestos: quando ouvi falar que Tico e Teco estariam de volta, e que seria uma mistura de live-action com animação, a primeira coisa que me veio à mente foi um daqueles reboots preguiçosos, feitos só para arrancar um suspiro dos velhos fãs e vender umas camisetas. Mas o que Dan Gregor e Doug Mand, os roteiristas, entregaram, em conjunto com a visão de Schaffer, é algo que vai muito além. É uma carta de amor (e uma beliscada nas costas) à própria indústria do entretenimento, especialmente para quem vive e respira a cultura cartoon.
A premissa, por si só, já é um espetáculo de meta-linguagem. Imagine Tico e Teco não como os heróis que conhecíamos, mas como ex-estrelas de TV que, bem, tiveram seus dias de glória. Tico, interpretado com uma voz nostálgica por John Mulaney, se transformou em um vendedor de seguros em um subúrbio de Los Angeles, apegado à sua forma 2D clássica, como uma relíquia de um tempo mais simples. Teco, por outro lado, dublado com a energia e o timing cômico de Andy Samberg, fez uma “harmonização facial” em CGI, tentando desesperadamente se manter relevante no circuito de convenções nostálgicas. É a velha Hollywood, ou melhor, a velha Toontown, confrontada com a era digital, e a dissonância entre os dois é palpável, quase dolorosa.
Aí entra o mistério. Um ex-colega de elenco desaparece. E não é qualquer desaparecimento; o rastro leva a um submundo de bootlegs e produções piratas, onde personagens são alterados, roubados e forçados a participar de versões baratas de suas antigas glórias. É uma crítica ácida à obsolescência programada da indústria, ao descarte de talentos e à exploração, tudo isso embalado em uma aventura que te puxa de volta para a Califórnia dos anos 80, mas com um toque amargo do século XXI. Will Arnett dá vida (ou voz) a Sweet Pete, um vilão que personifica essa corrupção com um toque de tristeza, e Eric Bana traz um Monterey Jack que evoca a nostalgia do original, mas com seus próprios demônios. KiKi Layne, como a detetive Ellie Steckler, é nossa ponte para o mundo humano, a voz da razão que tenta entender essa loucura animada.
| Atributo | Detalhe |
|---|---|
| Diretor | Akiva Schaffer |
| Roteiristas | Dan Gregor, Doug Mand |
| Produtores | Todd Lieberman, David Hoberman |
| Elenco Principal | Andy Samberg, John Mulaney, KiKi Layne, Will Arnett, Eric Bana |
| Gênero | Animação, Família, Comédia, Aventura, Mistério |
| Ano de Lançamento | 2022 |
| Produtoras | Walt Disney Pictures, Mandeville Films |
O que me cativou foi a forma como o filme joga tudo na parede para ver o que cola. E, de certa forma, quase tudo cola, mas o excesso é a sua maior virtude e, ao mesmo tempo, um desafio. Você se pega rindo de um cameo inesperado, processando uma piada meta sobre os diferentes estilos de animação, e ao mesmo tempo tentando acompanhar a trama de detetives. É como se a produção da Walt Disney Pictures e Mandeville Films tivesse aberto uma caixa de Pandora de referências, desde a era de ouro da animação até os memes mais recentes. Há momentos em que a tela está tão cheia de personagens, estilos e piadas, que você sente o cérebro fervilhando para tentar absorver tudo. É muito para digerir, sim, como algumas críticas apontaram na época do lançamento, mas para um fã de cultura pop, é um banquete.
O embate entre o 2D clássico de Tico e o 3D “modernizado” de Teco não é apenas um truque visual; é o coração do filme. Ele explora a ideia de amizade, de como as pessoas mudam e se afastam, e como é difícil consertar os laços rompidos pelo tempo e pelas ambições diferentes. Ver esses dois former best friends tendo que aprender a trabalhar juntos novamente, superando décadas de ressentimento e ego (especialmente o de Teco com seu CGI duvidoso), é o que dá a profundidade emocional necessária para sustentar a avalanche de comédia e referências. O filme nos mostra as mãos trêmulas de Teco quando ele fala de sua necessidade de aceitação, e o olhar cansado de Tico com a vida suburbana.
E não se engane, a aventura tem seu quê de mistério Noir, com uma pitada de “Quem Quer Enquadrar Roger Rabbit?”, mas com uma sensibilidade moderna. Há um “duringcreditsstinger” que brinca com as expectativas e um universo onde ‘corrupt cop’ pode ser literalmente um personagem de desenho animado desonesto. É inteligente, engraçado e, sim, às vezes beira o caótico.
No fim das contas, Tico e Teco: Defensores da Lei não é um filme perfeito. Sua ambição desmedida pode ser esmagadora para alguns, e a mistura de estilos visuais pode parecer um “quadro de um artista ruim” para os mais puristas, com algumas expressões faciais que beiram o “alienígena” em certos personagens. Mas, para mim, é exatamente nessa bagunça controlada, nessa tentativa de abraçar o novo sem abandonar o velho, que reside sua genialidade. É uma reflexão sobre a nostalgia, a relevância e o que realmente significa ser um “Defensor da Lei” em um mundo que está em constante mudança. E quem sou eu para não aplaudir essa coragem? Você deveria dar uma olhada. Ele te fará pensar, e talvez até cantarolar de novo.




