Ah, To Cook a Bear. Sabe, quando a gente se senta para assistir a algo novo, especialmente um mistério nórdico, sempre há uma faísca de esperança. A esperança de que não será apenas mais um crime genérico, mas algo que grude na gente, que nos faça pensar dias depois. E, meu amigo, To Cook a Bear, lançado este ano, em 2025, não só acendeu essa faísca como a transformou num incêndio que ainda me consome.
Eu, particularmente, sempre fui fascinado pela maneira como as produções nórdicas conseguem nos envolver em tramas densas, onde a paisagem gélida e o silêncio cortante são quase personagens por si só. Há uma humanidade crua ali, uma vulnerabilidade que desarmou as minhas expectativas e me jogou de cabeça na aldeia de Korpviken, um lugar onde a neve não apenas cobre a terra, mas parece sufocar as almas de seus habitantes. Foi lá que a série nos levou, para o coração de um mistério que é tão brutal quanto as paisagens que o emolduram.
A premissa, por si só, já é um anzol: um assassinato chocante desestabiliza a pequena comunidade, e a chegada de um homem enigmático, conhecido apenas como “O Padre”, interpretado com uma quietude perturbadora por Gustaf Skarsgård, é o catalisador de tudo. Ele não é o detetive tradicional que esperamos; há algo nos seus olhos, um mistério que compete com o crime que ele parece ter vindo desvendar. Ou talvez não. Lindmark, o policial local vivido por Jonas Karlsson, encarna a exaustão de quem está preso entre a lei e os laços indissolúveis de uma aldeia onde todos se conhecem (ou pensam que conhecem). Você vê a tensão escorrendo dos ombros dele, a luta interna entre a lealdade ao seu povo e a necessidade urgente de justiça.
E o que dizer de Pernilla August como Madam Sjödahl? Ah, essa mulher é uma força da natureza. Sua personagem é a matriarca da aldeia, uma figura imponente, cujos silêncios dizem mais do que qualquer grito. Cada vez que ela aparecia em cena, parecia que o ar ficava mais pesado, como se ela fosse a personificação da própria tradição e dos segredos que a comunidade se esforça para manter enterrados. É como se ela puxasse os fios de uma teia invisível, manipulando a todos sem mover um músculo, apenas com um olhar gélido. É arrepiante.
Atributo | Detalhe |
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Diretor | Trygve Allister Diesen |
Roteirista | Jesper Harrie |
Produtor | Mia Welin |
Elenco Principal | Gustaf Skarsgård, Jonas Karlsson, Pernilla August, Ane Dahl Torp, Magnus Krepper |
Gênero | Crime, Drama, Mistério |
Ano de Lançamento | 2025 |
Produtoras | Anagram, The Walt Disney Company Nordic |
A genialidade de Jesper Harrie, o roteirista, reside exatamente nessa habilidade de tecer uma trama onde a cada camada que se retira, encontramos não uma resposta simples, mas mais perguntas, mais dilemas morais. Não há heróis de capa e espada aqui. Cada um dos personagens, de Brita Kajsa (Ane Dahl Torp), que carrega uma vulnerabilidade quase palpável, a Brahe (Magnus Krepper), cuja presença é uma ameaça constante, são peças de um quebra-cabeça humano intrincado. Você vê as rachaduras na fachada, a maneira como o medo e a desconfiança corroem as relações, e é impossível não sentir uma pontada de empatia, mesmo pelos mais questionáveis.
O título, To Cook a Bear, para mim, é a alma da série. Não é sobre cozinhar um urso de verdade, claro. É uma metáfora cruel e visceral para o tipo de verdade que eles precisam caçar, matar e, de alguma forma, digerir. É a tarefa quase impossível de confrontar um mal tão grande, tão enraizado, que parece inatingível. É a luta para desenterrar algo que a comunidade preferiria deixar em hibernação, não importa o custo. E Trygve Allister Diesen, na direção, orquestra essa caçada com uma maestria que te prende do primeiro ao último segundo. A câmera se move com uma lentidão deliberada que espelha o ritmo da vida na aldeia, mas também constrói uma tensão que te faz prender a respiração, esperando o próximo golpe. As sombras são mais escuras, o frio mais intenso, e a sensação de isolamento, palpável.
A produção de Mia Welin, junto com Anagram e a The Walt Disney Company Nordic, mostra que o investimento em histórias complexas e autênticas não é apenas possível, mas necessário. Não é uma série que busca o glamour, mas a profundidade. Cada detalhe, do figurino pesado que os personagens usam contra o frio até a iluminação que joga com o pouco sol daquelas latitudes, contribui para a imersão total. Você quase consegue sentir o cheiro da fumaça das lareiras, o ranger da neve sob as botas. É uma experiência sensorial completa, que te puxa para dentro daquele mundo gelado e perturbador.
E é isso, né? É essa capacidade de nos fazer questionar a própria natureza humana, de nos mostrar as nuances do que nos torna falhos e, ainda assim, resilientes, que faz de To Cook a Bear algo tão especial. Não é uma história para ser assistida levianamente; é para ser sentida. Ela te confronta com perguntas desconfortáveis sobre justiça, fé, silêncio e as escolhas que fazemos quando somos empurrados para o limite. E para mim, é exatamente isso que a torna uma obra de arte que, sem dúvida, vai morar na minha cabeça por um bom tempo.