Existe uma sensação quase nostálgica em revisitar filmes, especialmente aqueles que, à primeira vista, parecem pura diversão, mas que, um ano depois de seu burburinho inicial, ainda provocam um sorriso e um pensamento. É o caso de Todas Menos Ela, que chegou aos cinemas em 2024 e, agora, em outubro de 2025, ainda ecoa na minha memória com uma mistura de riso frouxo e uma pontinha de reflexão sobre as complexas dinâmicas de amizade e julgamento. E, cá entre nós, quem nunca se viu naquela saia justa de ter um amigo se envolvendo com alguém… digamos, desafiador?
O filme, dirigido com uma perspicácia notável por Luis Kuri e roteirizado com uma acidez deliciosa por Ricardo Avilés, mergulha de cabeça nessa premissa universal: um grupo de amigos inseparáveis se vê de repente confrontado com a chegada de uma “intrusa” que ameaça o equilíbrio de seu santuário. Luis (Ricardo Abarca), o elo central dessa turma, está noivo de Sandra (Cassandra Sánchez Navarro), e os amigos – Gaby (Carolina Miranda), Norma (Ana González Bello) e Roberto (Jesús Zavala) – simplesmente não aguentam a mulher. A sinopse é direta: eles encontram o pretexto perfeito para se livrar dela quando descobrem que Sandra não é quem parece. Mas acredite, a jornada até essa revelação é tudo menos previsível.
A beleza de Todas Menos Ela não está apenas nas situações hilárias – e tem muitas, daquelas de segurar a barriga e espiar entre os dedos – mas na forma como a comédia se entrelaça com um estudo quase antropológico sobre o que significa ser amigo. Você sente a história de Gaby, Norma e Roberto, a cumplicidade que se manifesta em olhares trocados e piadas internas que só eles entendem. Ricardo Abarca, como Luis, interpreta com maestria o desespero de um homem dividido entre a lealdade aos amigos de uma vida e o que ele acha ser o amor. Suas microexpressões de pânico quando os dois mundos colidem são um show à parte, um prato cheio para quem gosta de captar os pequenos detalhes que constroem um personagem.
Mas é Cassandra Sánchez Navarro, como Sandra, que segura uma das pontas mais afiadas do filme. Ser a “noiva insuportável” é um papel ingrato, mas ela o eleva a um patamar onde você, como espectador, se pega questionando seus próprios preconceitos. Será que ela é realmente tão má, ou apenas diferente demais para o clã? A forma como Sandra se porta, o ar de superioridade, a inflexibilidade… tudo é construído com uma sutileza que permite que a grande reviravolta seja não só impactante, mas também, de certa forma, justificada. É aquele tipo de atuação que te faz odiar o personagem com carinho, sabe? E quando o tapete é puxado de debaixo dos nossos pés, a gente se dá conta do quão manipuláveis nossas percepções podem ser.
| Atributo | Detalhe |
|---|---|
| Diretor | Luis Kuri |
| Roteirista | Ricardo Avilés |
| Produtores | Luis Vizcaino, Michelle Vizcaino, Michel Limón, Carlos Castillo P. |
| Elenco Principal | Cassandra Sánchez Navarro, Ricardo Abarca, Carolina Miranda, Ana González Bello, Jesús Zavala |
| Gênero | Comédia |
| Ano de Lançamento | 2024 |
| Produtora | No Idea Entertainment |
A direção de Luis Kuri consegue manter um ritmo ágil, sem deixar que o humor se perca em piadas previsíveis. Há uma inteligência na forma como ele enquadra as interações, ressaltando a claustrofobia da situação para Luis e a união quase tribal dos amigos. O roteiro de Ricardo Avilés, por sua vez, é afiado, com diálogos que soam orgânicos e, muitas vezes, dolorosamente familiares para quem já participou de um drama de grupo. Não é só a piada pela piada; é a comédia que surge da tensão, do constrangimento, daquela vontade incontrolável de dizer algo que você não deveria.
A produção da No Idea Entertainment, com Luis Vizcaino, Michelle Vizcaino, Michel Limón e Carlos Castillo P. como produtores, entregou um filme que, visualmente, é limpo e moderno, sem artifícios que tirem o foco do que realmente importa: as pessoas e suas reações. É um palco onde a química do elenco principal realmente brilha, transformando a tela em um convite para espiar a vida de amigos que, no fundo, só querem proteger um ao outro – ainda que de uma maneira um tanto questionável.
No fim das contas, Todas Menos Ela é mais do que uma comédia simples. É um espelho que reflete as complexidades das amizades adultas, o medo da mudança e, sim, a maneira como somos rápidos em julgar quem não se encaixa em nossos pequenos universos. Se você busca um filme que te fará rir alto, mas também te fará pensar um pouco sobre a fragilidade das aparências e o poder do preconceito, essa é uma ótima pedida. E quem sabe, talvez você até comece a olhar para a “Sandra” da sua vida com outros olhos. Ou, pelo menos, com um pouco mais de desconfiança. Porque, no cinema e na vida, nem tudo é o que parece.




