Existe uma angústia peculiar que habita o vazio deixado por alguém que era, de certa forma, sua outra metade. Falo da perda, claro, mas de um tipo específico dela, daquela que rasga não só o coração, mas a própria noção de quem você é. É sobre essa dor quase existencial que Twinless, o filme de James Sweeney que estreou no último dia 3 de outubro e que ainda reverbera em mim agora, em 13 de outubro, ousa mergulhar. E, veja bem, não é um mergulho qualquer; é um que abraça a dor, a confusão e, surpreendentemente, o riso, tudo junto num nó que faz a gente questionar as linhas tênues da nossa própria identidade.
Por que eu me peguei pensando tanto nesse filme nos últimos dias? Porque ele se recusa a ser apenas mais uma história sobre luto. Twinless é uma dramédia que tem a audácia de nos colocar diante do impensável: o luto de perder um irmão gêmeo, essa pessoa que te acompanhou desde o ventre, um espelho, um confidente inato. E o filme faz isso não com um, mas com dois homens enlutados: Roman, vivido por um Dylan O’Brien que nos entrega uma performance de uma vulnerabilidade quase palpável, e Dennis, interpretado pelo próprio James Sweeney, cujo olhar carrega uma melancolia que se agarra na gente.
A premissa é simples, mas o impacto é profundo: Roman e Dennis se encontram num grupo de apoio. Duas almas perdidas, cada uma carregando o peso intransferível da morte de seu gêmeo. Roman, com seu jeito um tanto desajeitado de quem está tentando (e falhando) em se reerguer, e Dennis, com uma quietude que esconde uma tempestade. A amizade que nasce entre eles é, de início, quase um bálsamo. É aquele momento em que você encontra alguém que realmente entende o seu tipo específico de cicatriz, sem precisar de palavras. Eles riem juntos de memórias amargas, choram em silêncio, e até mesmo brigam como irmãos, porque o luto, a gente sabe, não é um processo linear ou sempre bonitinho.
O que o diretor e roteirista James Sweeney faz aqui é algo de mestre. Ele não apenas nos apresenta a dor; ele a desdobra em camadas que nos fazem, como espectadores, sentir o chão oscilar sob os pés. Sweeney, que também nos dá um Dennis cheio de complexidades, tem a capacidade de transformar a angústia mais crua em algo belo e, por vezes, até engraçado. É como se a vida real estivesse ali, nua e crua, com seus momentos de choro compulsivo seguidos por um riso inesperado, quase culpado, que só quem já passou por algo assim compreende. A câmera de Sweeney não desvia dos olhares perdidos, das mãos que tremem ao tocar um objeto que pertencia ao irmão que se foi, dos silêncios que dizem mais que mil falas.
Atributo | Detalhe |
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Diretor | James Sweeney |
Roteirista | James Sweeney |
Produtores | David Permut, James Sweeney |
Elenco Principal | Dylan O'Brien, James Sweeney, Lauren Graham, Aisling Franciosi, Arkira Chantaratananond |
Gênero | Comédia, Drama |
Ano de Lançamento | 2025 |
Produtoras | TPC, Permut Presentations, Backyard Plane |
E é nessa intimidade que a trama de Twinless começa a torcer suas linhas. Porque, por trás da amizade e da dor compartilhada, há segredos. Segredos que, à medida que emergem, nos forçam a questionar: até que ponto a identidade de um gêmeo está atrelada à do outro? Onde termina a individualidade e começa a obsessão em tentar preencher o vazio deixado? Dylan O’Brien, no papel de Roman, nos mostra isso com uma riqueza de detalhes. Ele se joga na complexidade do personagem, nos levando por um turbilhão de emoções – da vulnerabilidade à raiva, da negação à busca desesperada por conexão. Sua performance é um lembrete vívido de que a dor pode nos moldar de formas imprevisíveis, borrando as fronteiras do que somos e do que queremos ser.
Não posso deixar de mencionar o elenco de apoio que completa essa tapeçaria emocional. Lauren Graham, como Lisa, traz uma dose de humanidade e sensatez, representando uma voz externa que tenta compreender o incompreensível. Aisling Franciosi, interpretando Marcie, e Arkira Chantaratananond, como Judy, também entregam performances que dão mais corpo e dimensão ao universo dos protagonistas, mostrando como a dor de Roman e Dennis reverbera nas pessoas ao seu redor.
A profundidade que Twinless atinge ao explorar a amizade masculina, a perda de um irmão e, sim, os nuances de um tema gay que permeia a conexão entre Roman e Dennis, é algo raro. Não é apenas sobre atração, mas sobre a busca por uma alma que entenda a sua, por um eco em meio ao silêncio ensurdecedor da ausência. O filme aborda essa complexidade com uma sensibilidade que evita clichês, mostrando que o amor e a conexão podem surgir de lugares inesperados e sob formas multifacetadas. É uma história sincera e empática que nos convida a sentir, a pensar e a nos reconhecer nos recortes de uma experiência que, embora específica, é universal em sua essência.
Twinless é, em suma, uma obra que se arrisca e sai vitoriosa. Não é um filme que entrega respostas fáceis, mas que nos oferece um espelho para a complexidade da condição humana diante do luto e da busca por identidade. É uma experiência que, para mim, transcende a tela, permanecendo na mente e no coração, provocando aquele tipo de reflexão que só a arte verdadeira consegue incitar. Se você tá procurando um filme que te desafie, te faça rir em meio às lágrimas e, no final, te deixe com aquele nó na garganta de quem acabou de testemunhar algo genuíno, Twinless é a pedida certa. Ele é, como a própria crítica já apontou, uma prova de que a dor pode, sim, ser transformada em arte inspiradora. E que arte!